São Paulo, sexta-feira, 25 de fevereiro de 2000


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OFICINA EM LIVRO
Ode à casa do "Te-Ato"

FRANCESCA ANGIOLILLO
da Redação


Existe em São Paulo, nos baixos de um viaduto, um espaço destinado a celebrações pouco ortodoxas. O viaduto é o Minhocão, cicatriz indelével; o espaço de que falamos, de proporções bem menores e, infelizmente, menos marcante no contexto urbano do que seu vizinho, é o teatro Oficina.
As idéias que deram forma ao palco de José Celso Martinez Corrêa estão em um livrinho, "Teatro Oficina", lançamento conjunto do começo do ano da editora portuguesa Blau e do Instituto Lina Bo e P.M. Bardi.
Lina -autora de outra referência na paisagem paulistana, o Masp- concebeu, entre 80 e 84, a reconstrução do teatro, destruído por um incêndio em 66.
O livro tem, por assim dizer, duas partes. A primeira, mais "terrena", é uma apresentação feita pelo arquiteto Edson Elito -que tocou a reconstrução com Lina-, que vem logo após uma brevíssima introdução da arquiteta, mas que basta para que Lina nos lembre a que veio o projeto: dar forma à "verdadeira significação do teatro- sua estrutura Física e Táctil, sua Não-Abstração- que o diferencia do cinema e da tevê, permitindo ao mesmo tempo o uso total desses meios".
E que teatro seria mais físico e "promíscuo" em sua relação com o espectador do que o Oficina, com sua rua, seus bancos quase na cena, "espelhando-se como duas fatias de pão de um sanduíche"? O "terreiro eletrônico", como diz Zé Celso, seu babalaô.
Elito, em seu texto, explica como se deu forma ao conceito. Como a rua central que é o palco do Oficina tornou-se mais rua do que a rua embaixo do viaduto. Como os quatro elementos da natureza estão representados no projeto. Como a memória do teatro que existia ali permanece no que se preservou das paredes.
Aqui e ali, os primeiros desenhos, fotos da obra, alguns detalhes do projeto. Mas este não é um livro para estudar a arquitetura, se bem que ela seja tocante. Ele é como se fosse uma homenagem a esse teatro que é um "bunker", como o livro mesmo diz. O porão da resistência do Uzyna Uzona, da dramaturgia de Zé Celso, da crença de seu grupo.
É aí que chegamos à segunda parte. Entra em cena Zé Celso.
O texto, bem, é dele. Quem o conhece já espera a ortografia, acentuação e a divisão silábica próprias, o tom poético e verborrágico, pelo qual nomes comuns viram próprios, as maiúsculas tornando palavras personagens.
O autor vai misturando sua história pessoal à do espaço -elas são indissociáveis-, a partir de sua ligação geográfica na infância (ali na região morava seu avô).
Os fatos vêm recheados à maneira de Zé Celso. Que maneira? Chamar o Minhocão de "Muro de Berlim", por exemplo.
Conta episódios como o do dinheiro de Maluf que Juruna rejeitou e que ele, Zé, então aceitou na TV. E mais: sacramentou a "doação" com leitura de um trecho de "As Bacantes", com o próprio Maluf. "Leu bem, é um ator."
E assim vai, costurando sua vida à do país e à do Oficina, conto no qual "as personagens... têm uma história de luta por um teatro concreto" e o lugar "é uma metáfora arquitetônica e urbana de uma postura diante do Teatro".
Lugar que renasceu de um tombamento, em 81, com parecer do arquiteto e cenógrafo Flávio Império, o qual justificava a ação "não pela importância histórica do imóvel", então descaracterizado e pedindo reforma, mas "pelo seu uso como palco das transformações do teatro brasileiro". Que elas continuem. Evoé!


Avaliação:     

Livro: Teatro Oficina Autores: Lina Bo Bardi, Edson Elito, José Celso Martinez Corrêa Editora: Blau e Instituto Lina Bo e P.M. Bardi (0/xx/11/3744-9902) Quanto: R$ 10 (bilíngue, sem numeração de págs.)

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