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CDS
MPB
Disco traz canções interpretadas por artistas como Fernanda Abreu e Toquinho
Pasmaceira cinzenta aniquila pouco brilho de "Salve Jorge"
ALEXANDRE MATIAS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Aurora do século do caos e a tal
linha evolutiva da MPB concebida
por Caetano Veloso para justificar
historicamente o Tropicalismo é
apenas uma entre as dezenas de
vias possíveis. A ascensão de novos mitos e ícones, em paralelo à
revisão secular da reputação de
velhos heróis, expandiu o conceito de música brasileira para além
do apertado Olimpo crescido sob
o jazz e a bossa nova, elite reunida
ao redor de Chico e Caetano.
As décadas de transição que
atravessamos nos apresentaram a
novos cânones (hip hop, eletrônica, funk carioca, mangue beat),
reciclando gêneros (black music,
reggae, música caipira, samba de
raiz, forró, samba-rock) e revendo velhos mestres (em caixas de
CD, DVDs, songbooks e até literais ressurreições de carreiras tidas como mortas). A quantidade
de novos nomes arquivados na
gaveta "Música Brasileira" no
atual imaginário coletivo não fixa
seus olhos em poucos escolhidos.
Há uma constelação de artistas,
cujo mínimo denominador comum talvez seja uma certa crueza
sentimental, aspereza lírica que
pode se traduzir tanto em choro
de raiva quanto em alegria tranqüila. E como num estereograma,
duas figuras saltam como o yin e o
yang desta galáxia: Roberto Carlos e Jorge Ben. Ambos filhos da
bossa nova, beberam na falta de
sutileza do rock para converter
realidade em música, sem firulas
poéticas. Ambos atravessam um
longo período de reabilitação pública. Tornaram-se redundantes
no início da década de 90 ao mesmo tempo em que seus anos 70
eram descobertos por toda uma
nova geração de músicos, dispostos a reler seus trabalho com novas ferramentas. Vieram regravações, acústicos e coletâneas. Suas
carreiras foram revistas e suas reputações, confirmadas.
Assim, "Salve Jorge" não consegue ser nada além de apenas mais
uma das homenagens que Ben recebe desde que começou a perder
a mão. Percebem-se as proverbiais boas intenções, mas falta
profundidade e foco. Numa tentativa de abranger a pluralidade
não-linear da atual MPB, esquece
de focar em dois gêneros em que
Jorge Ben é capital na afirmação
de uma identidade nacional:
drum'n'bass e hip hop. O fato de
ser um apanhadão de gravações
ajuda a desqualificar o projeto.
O brilho específico de faixas como "Mas que Nada" com o Tamba Trio e a boa surpresa de uns
poucos ("Errare Humanum Est"
com Zé Ramalho) são aniquilados pela pasmaceira cinzenta de
versões que mal passam da linha
da cintura. É claro que não dá pra
jogar Fernanda Abreu, O Rappa,
Maurício Manieri e Gal Costa na
mesma vala (pensando bem... por
que não?), mas se até bambas como Jorge Aragão e Toquinho erram feio ao apostar no trivial...
Se comparada a "Músicas para
Tocar em Elevador" (1997), "Salve
Jorge" parece mero gesto infantil
de levar a mão ao peito quando vê
a seleção cantar o hino nacional: é
intuitivo, feito às pressas e mostra
um respeito canino que quase resvala no medo. Mas, sabe como é,
tem gente que acha bonitinho...
Salve Jorge
Artista: vários
Gravadora: BMG
Quanto: R$ 35, em média
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