São Paulo, terça, 25 de março de 1997.

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DISCOS LANÇAMENTOS
Disco solo de Karen Carpenter é exumado 18 anos depois

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Redação

Mais um episódio da série "tesouros da juventude": 18 anos atrasada, a PolyGram tira do baú um disco que Karen Carpenter (1950-1983), uma das metades do duo Carpenters, gravou sozinha e -por razões até hoje não explicadas- desistiu de lançar.
Com um montante de cerca de 90 milhões de discos vendidos desde seu surgimento, em 1968, a dupla norte-americana foi, nos anos 70, um dos pilares pop do mercado fonográfico -mais em termos de popularidade que de prestígio.
Praticando música francamente cafona, de inflexões às vezes grandiloquentes, quase sempre tristonhas e sempre melosas, Karen e seu irmão Richard ganharam o mundo nos anos 70, tendo rivais de peso apenas em Elton John, Paul McCartney e Bee Gees.
Fizeram dezenas de top hits, entre criações próprias ("Only Yesterday", "Top of the World") e reinterpretações pessoais -cafonas, portanto- de Beatles ("Help", "Ticket to Ride"), Tim Hardin ("Reason to Believe"), Carole King ("It's Going to Take Some Time"), Neil Sedaka ("Solitaire", "Breaking Up Is Hard to Do"), Henry Mancini ("Sometimes") e Burt Bacharach ("Close to You", "I'll Never Fall in Love Again"). A crítica odiava.
Qual seria então o interesse de exumar "Karen Carpenter", disco solo solitário na carreira da cantora e baterista que morreu aos 32, de ataque cardíaco decorrente de anorexia nervosa (doença que provoca rejeição de alimentos)?
Há várias explicações possíveis -e complementares. Nos 90, em pique de revalorização do relicário kitsch do pop, os Carpenters viraram sensação.
Gente talentosa como Sonic Youth, Beck, Cibo Matto, Pizzicato Five, Shonen Knife, Cardigans, Luna, Yo La Tengo, Stereolab, Pulp, Johnette Napolitano, Grant Lee Buffalo e outros tantos rendem tributo -direto ou indireto- aos fazedores de melô que infestaram as rádios de duas décadas atrás.
Sonic Youth, por exemplo, compôs, para o disco "Goo" (90), "Tunic (Song for Karen)", um tributo emocionado, grave e depressivo a Carpenter.
Transformou, também, "Superstar" (71) numa das mais belas e intensas baladas dos 90, no tributo "If I Were a Carpenter" (PolyGram, 94, lançado no Brasil), de que participam, também, Cracker, Bettie Serveert, Sheryl Crow e os Cranberries da neo-anoréxica Dolores O'Riordan, entre outros.
Tais evidências dão a pista para outra constatação: a cafonália de sucessos como "Rainy Days and Mondays" e "Sing" são, nestes 90, muito contemporâneas. Não deixa de ser como imaginar que em 20 anos Fábio Jr. venha a ser considerado genial, mas o cimento dos anos revelou o viço escondido das canções dos Carpenters.
Enfim, há a justificativa em si para a existência, em 97, de "Karen Carpenter": o CD promete a revelação de outra faceta da cantora. As 12 canções -algumas das quais o irmão espertinho já lançara no álbum póstumo "Lovelines" (89), como se fossem da dupla- oscilam entre soul, rhythm'n'blues e a mais deslavada discotèque, sempre em clave de black music.
É um belo paradoxo: a magrela/branquela, em voz mais Tina Charles que Donna Summer, comete peças de puro rhythm'n'blues ("Lovelines" e "If I Had You") e baladas emocionantes ("Making Love in the Afternoon").
E há, mesmo, os momentos disco music, com ápice em "My Body Keeps Changing My Mind" (Meu Corpo Continua Modificando Minha Mente), que traz a esquisitice meio macabra de fazer a moça recatada pregar a mudança da mente pelo movimento do corpo.
No mais, o disco escondido é Carpenters tradicional, em jazzinhos de elevador ("Guess I Just Lost My Head"), melancolia ("Make Believe It's Your First Time") e cover de Paul Simon ("Still Crazy After All These Years"); ou seja, cafonice. A PolyGram -que no Brasil não conserva nenhum outro título da dupla em catálogo- só podia ter economizado a medonhice da capa.


Disco: Karen Carpenter Lançamento: PolyGram Quanto: R$ 18, em média

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