São Paulo, segunda-feira, 25 de março de 2002

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25ª BIENAL DE SÃO PAULO

Nudez permitida


Ao lado de Vanessa Beecroft, Spencer Tunick, um dos responsáveis pela "invasão" de nus no evento inaugurado ontem para o público, diz que seu trabalho é "explosão da vida"


Spencer Tunick/Divulgação
Corpos sobre a Queensboro Bridge, em NY, em performance do norte-americano Spencer Tunick presente na Bienal


FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Nunca a Bienal de São Paulo apresentou tantos nus em uma exposição. Ontem foi a vez do pelotão feminino, comandado por Vanessa Beecroft, com a performance "VB50". As mulheres posaram por três horas dentro do pavilhão da Bienal.
A explosão de nus deve ocorrer mesmo no dia 27 de abril, quando o nova-iorquino Spencer Tunick realizar a sua performance: fotografar pessoas nuas que comparecerão espontaneamente no parque Ibirapuera às 5h30.
Da última vez, em Melbourne, 4.500 pessoas participaram. Por realizar as imagens em locais urbanos, Tunick já chegou a ser preso seis vezes nos EUA. "Aqui não devo ter problemas, a Bienal já conseguiu a permissão", afirma o artista.
Em São Paulo, Tunick, 35, espera menor afluência. "Se vierem 800 pessoas está ótimo", diz. Para participar, os interessados devem escrever para o e-mail bienal.spencer@uol.com.br. "É a porta de ouro. Só quem entrar em contato pode participar", afirma Tunick. Como prêmio, quem posar pelado vai ganhar uma foto.
Ontem, enquanto buscava o local mais adequado do parque Ibirapuera para realizar seu trabalho, Tunick conversou com a Folha. Leia a seguir alguns trechos da entrevista.

Folha - Como você começou a fazer esse trabalho?
Spencer Tunick -
No início, eu fotografava apenas uma pessoa nua por vez nas ruas de Nova York, era como registrar uma escultura. O trabalho tornou-se famoso e muitos me procuravam para servir de modelo. Por isso, em 94, resolvi reunir vários interessados em frente ao edifício da ONU durante o amanhecer. O resultado superou minhas expectativas e essas massas humanas tornaram-se a parte mais interessante do trabalho.

Folha - E por que escolher a nudez?
Tunick -
Quero comunicar uma experiência que una as pessoas e as purifica. Quando se vê um corpo nu num espaço público, a fragilidade desses corpos é a primeira impressão.
Para mim, esse trabalho é uma instalação e uma performance combinadas. Participar delas é uma nova experiência, quem estiver lá não vai se arrepender.

Folha - O curador da Bienal, Alfons Hug, tinha um certo receio em apresentar as fotos, pois elas lembram um campo de concentração. Você concorda?
Tunick -
Os alemães precisam perder essa culpa pelas catástrofes no século 20, eles não foram os únicos a promover um holocausto. Só porque existem imagens em preto-e-branco dos campos de concentração eles não devem achar que são os únicos na história a promover isso.
Eu reconheço semelhanças com tais imagens, mas meu trabalho trata da explosão da vida por meio de corpos nus, e não do contrário. Por isso, passei a fazer apenas fotos coloridas dessa série.

Folha - Vanessa Beecroft também trabalha com várias pessoas nuas ao mesmo tempo. Qual a diferença existente entre as obras dela e as suas?
Tunick -
Creio que Vanessa busca criar um estranhamento com suas imagens. Com a forte propaganda da moda nas revistas, ela aponta para uma certa inconfortabilidade, é uma boa forma de crítica social, com o que todo artista deve se preocupar.

Folha - E qual é a crítica que você faz com suas imagens?
Tunick -
Várias pessoas são presas no mundo por estarem nuas. Busco criar uma tensão entre o corpo humano e as cenas urbanas. É importante olhar para o corpo como objeto de arte, e não apenas de sexo.

Folha - Você já foi preso por causa de suas performances?
Tunick -
Seis vezes nos Estados Unidos, sendo cinco apenas em Nova York. Cheguei a processar a prefeitura da cidade por causa disso, pois não há lei que proíba esse tipo de performance. Ganhei a causa na Suprema Corte, mas mesmo assim não consigo permissão para novos trabalhos lá.
Apesar de continuar a viver em Nova York, decidi não mais trabalhar lá. Tenho convites de várias partes do mundo. Antes de São Paulo, vou trabalhar em Buenos Aires, por exemplo.


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