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CINEMA CRÍTICA
'City of Angels' deu certo
AMIR LABAKI
de Nova York
Era uma daquelas fórmulas
hollywoodianas de improbabilíssimo sucesso: uma refilmagem
americanizante do "cult" "Asas
do Desejo" (1988), de Wim Wenders.
Los Angeles substitui Berlim, o
sistema de estrelato exige Nicolas
Cage e Meg Ryan nos papéis centrais, a ênfase histórica cede lugar
ao enfoque romântico, sai Wenders e entra Brad Silberling. Milagre: deu mais do que certo.
"City of Angels" ("Cidade dos
Anjos") desbancou "Perdidos no
Espaço" e "Titanic" e há duas
semanas lidera o ranking de bilheterias nos EUA.
Deve perder o posto com a avalanche de estréias de ontem (um
novo "Tarzan", a bela Gwyneth
Paltron arrasando em "Sliding
Doors", o "bad boy" Robert
Downey Jr. num "menage a
trois" em "Two Girls and a
Guy"). Mas já fez bonito.
O sucesso deve-se, antes de tudo, ao sólido roteiro de Dana Stevens, que adapta para a Los Angeles atual os princípios básicos do
drama de Wenders.
A questão central continua sendo a sedução pela vida a partir da
paixão de um anjo por uma bela
mortal.
Stevens alivia a trama de certo
pedantismo do original, apostando em personagens fortes e frisando o encanto dos prazeres terrenos -sexo, acredite, relegado a
segundo plano.
O anjo Seth apaixona-se pela
médica Maggie ao vê-la entrar em
parafuso ao perder um paciente na
mesa de operações. Seth é um Cage todo de preto, mais melancólico que nunca. Uma sutil Ryan faz
Maggie e empalidece ainda mais a
lembrança de Solveig Dommartin.
O cupido que catalisa a relação é
um obeso e desobediente paciente, o dionisíaco Nathaniel Messinger. A grande sacada do "casting" foi escalar para o papel o
empático Dennis Franz da telessérie "NYPD".
Franz rouba as poucas cenas em
que aparece e duplica nessa versão
americana o impacto de Peter Falk
no "Asas" original.
A direção Silberling não nos furta de belas homenagens a Wenders, ao repetir sobre Los Angeles
as grandes panorâmicas sobre
Berlim ou as cenas em que os anjos devassam o cotidiano da cidade ao caminhar lendo as mentes
de seus habitantes.
Mas o jovem cineasta americano
é fiel ao espírito de "Asas" sobretudo ao refazê-lo a seu modo.
Wenders embalou sua fábula com
filosofia histórica alemã e acabou
flertando com o kitsch.
Silberling comenta a sua com
meros trechos de Hemingway
("Paris É Uma Festa") e chega a
um filme mais sincero e orgânico.
Se tivesse evitado o final previsivelmente melodrámatico, Hollywood inteira estaria comemorando sua mais importante vitória
frente ao estigma das refilmagens.
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