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"SONIC NURSE"
Banda de Nova York sugere que está cansada de fragmentar melodias e de fazer barulho em novo álbum
Mais maduro, Sonic Youth relê o rock clássico
GUILHERME WERNECK
EDITOR-ADJUNTO DA ILUSTRADA
"Sonic Nurse", terceiro disco do Sonic Youth com o
multiinstrumentista e produtor
Jim O'Rourke, e 15º álbum de estúdio da banda, vai ainda mais
fundo na busca por brandura impressa em álbuns recentes, como
"NYC Ghosts & Flowers" (2000) e
"Murray Street" (2002).
Num primeiro momento, isso
significa que a banda está mais
contida e madura. As antes características explosões de ruído violentas são raras e abafadas; o embate dissonante das guitarras,
marca registrada do Sonic Youth,
também arrefece. Por outro lado,
há uma delicadeza maior na construção das melodias, em fazer
com que as afinações pouco
usuais se encaixem na música de
forma menos aberrante, deixando as linhas melódicas menos fraturadas e com um leve sabor pop.
Em entrevista recente à revista
americana "Rolling Stone", o guitarrista Thurston Moore disse que
"Sonic Nurse" era como "uma
jam de Fleetwood Mac da época
de "Bare Trees" com Black Flag
dos tempos de "Jealous Again'".
Pode ser uma piada, mas ilustra
bem a sensação de que "Sonic
Nurse" é um disco em que o Sonic
Youth tenta dar seu próprio significado ao rock clássico.
Para perceber essa relação, é necessário voltar um pouco para as
raízes da banda, na Nova York do
começo dos anos 80, e entender
qual é o sentido de rock e de clássico para o Sonic Youth.
O encontro entre Lee Ranaldo e
Thurston Moore foi intermediado pelo compositor Glenn Branca. Os dois tocaram em sua orquestra de guitarras, marco zero
do movimento no wave, com o
qual a banda foi identificada.
Contudo, desde os primeiros
discos, o som que saía do encontro dos dois guitarristas -embora ambos flertassem com a música atonal e com afinações diferentes típicas da vanguarda nova-iorquina- seguia uma linha evolutiva que vinha do Velvet Underground, passava pelo rock dos
Stooges e do MC5, para desembocar na poesia punk de Patti Smith
e no hardcore do Black Flags.
Combinando essa forte influência do hardcore às conexões com
o mundo das artes plásticas, com
a famosa cena dos lofts de Nova
York, de onde saía a música experimental de gente como John
Zorn e Tom Cora, e com o free
jazz, a banda formou um estilo inconfundível, caraterizado pelas
mudanças de dinâmica comandadas pela bateria de Steve Shelley, pelas guitarras arredias e pelos vocais instintivos de Moore,
Ranaldo e Kim Gordon, que alternavam o canto levemente desafinado com gritos e sussurros.
Espécie de imperador do indie
rock na vanguarda, a banda chega
ao grande público em dois momentos. Primeiro com "Daydream Nation" (1988) e, depois,
com "Dirty" (1992), que teve edição de luxo lançada em 2003.
Na época de "Dirty", o Sonic
Youth estava em alta por ter sido a
banda que indicou o Nirvana para
ser contratado por sua gravadora,
a Geffen. Talvez por isso tenha optado pela guinada pop e por dar
mais visibilidade às letras cantadas por Kim Gordon.
A síntese pop de "Dirty" aparece de volta em "Sonic Nurse". Mas
ela não vem sozinha. Tem de se
debater com a chegada de
O'Rourke à banda e com seu gosto por criar tramas intrincadas ao
mesmo tempo em que busca dar
ordem ao caos.
Não por acaso, a matriz para as
canções de "Sonic Nurse" é "Rain
on Tin", de "Murray Street", que
capricha numa estrutura sonora
tridimensional, com uma melodia complexa. A diferença é que,
desta vez, a melodia foi aplainada,
domesticada, e, com isso, Kim
Gordon, com sua voz entre o sublime e o rascante, pôde cantar
como não fazia desde "Dirty".
Sonic Nurse
Artista: Sonic Youth
Gravadora: Universal
Quanto: R$ 35, em média
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