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Parlamento britânico é alvo dos irmãos Wachowski
SARAH LYALL
NEW YORK TIMES, DE LONDRES
Em uma rara concessão, as autoridades de Londres concordaram em fechar a região de Whitehall para três dias de filmagem, no
começo deste mês. Centenas de
membros da equipe técnica estavam posicionados na praça do
Parlamento, destaque para o Big
Ben e o London Eye. Mais de 100
figurantes interpretando tropas
governamentais de elite formavam uma fila diante do Parlamento, enquanto 400 outros, interpretando rebeldes, marchavam.
É esse o futuro próximo imaginado no filme "V de Vingança", a
ser lançado pela Warner Brothers, no qual o Reino Unido é governado por fascistas brutais, Natalie Portman é uma rebelde de
cabeça raspada e a mistura de herói e membro de esquadrão da
morte, V (Hugo Weaving), passa
o filme usando uma máscara.
Mas o mais radical no filme produzido e roteirizado pelos irmãos
Andy e Larry Wachowski e baseado na graphic novel homônima
de Alan Moore e David Lloyd, é
seu clímax. Trata-se de uma história em que uma população passiva se revolta contra o governo e
explode o Parlamento.
"V de Vingança" tem sua estréia
mundial prevista para 4 de novembro, véspera do 400º aniversário do dia de Guy Fawkes, que
relembra o complô original, tramado por católicos ingleses e
frustrado pelas forças leais, para
explodir o Parlamento inglês.
O filme se passa em uma Londres devastada, em 2020, arremessada a um período de apodrecimento aparentemente terminal.
Explosões nucleares, guerra
química e biológica, vírus incuráveis destruíram a maior parte do
resto do mundo, deixando o Reino Unido isolado. O governo
mantém os cidadãos sob uma
mistura de stalinismo e nazismo.
A essa sociedade chega V, um
mascarado com um passado terrível e o objetivo de derrubar o governo, que obtém a ajuda de Evey
(Portman), que adere ao movimento quando a consciência política lhe é forçada goela abaixo.
A história, na forma pela qual é
narrada na graphic novel, suscita
questões agudas sobre a moralidade do uso da violência no combate à opressão, e pergunta até
onde uma pessoa pode e deve ir a
serviço daquilo que acredita.
Para os realizadores, o filme não
oferece respostas fáceis. "É politicamente ambíguo, e quanto mais
crédito dermos à inteligência da
audiência, melhor", disse o diretor James McTeigue.
O projeto interessava há muito
aos Wachowski, que ficaram intrigados com a graphic novel original e pelas questões que ela provoca sobre "o poder que reside no
governo e nas pessoas, e de que
forma ele evolui", disse Grant
Hill, produtor do filme com os irmãos e Joel Silver. Segundo ele, os
temas são relevantes para as
atuais preocupações do mundo,
da guerra do Iraque à rejeição da
constituição européia pelos eleitores da França e da Holanda.
Que Hill pudesse trabalhar nessa locação, e no meio da noite, representa um triunfo dos poderes
de persuasão de Nick Daubeny, o
supervisor de locação do filme em
Londres. Daubeny teve de negociar com cerca de 14 agências diferentes em Londres, entre as quais
o Ministério da Defesa, o departamento de polícia e a agência que
coordena os transportes urbanos,
antes de obter permissão para filmar diante do Parlamento. Todos
os funcionários envolvidos receberam uma cópia do filme e foram informados que o Parlamento seria explodido. "Mas me concentrei nos perigos de um Estado
totalitário, e no fato de que a cena
representaria a restauração da democracia", disse Daubeny.
Uma das decisões mais importantes foi como criar a fantasia
que V emprega para cobrir seu
corpo e rosto devastados pelo fogo. (É uma parte de seu histórico,
e se relaciona a uma passagem
por um campo de concentração
dirigido pelo governo.) Paterson
se manteve mais ou menos fiel à
máscara imaginada pelos autores
originais. É uma clássica máscara
de Fawkes, e reforça o senso de
conexão, no filme, entre o passado remoto do Reino Unido e o
presente, que pode ser interpretada de diversas maneiras.
Paterson disse que a máscara tinha por objetivo criar uma sensação teatral, de dúvida e mistério.
Mas provou-se difícil de usar como uma fantasia plausível quando as filmagens começaram e outro ator, James Purefoy, estava interpretando o personagem título.
Depois de cerca de um mês, os
realizadores decidiram que Purefoy não era ideal para o papel, e
Weaving foi convocado. "A máscara não estava funcionando, e eu
tinha de fazê-la funcionar", afirma Weaving. Um ponto crucial é
que V jamais é desmascarado, detalhe cujo objetivo é indicar que
ele é mais símbolo do que alguém.
"Ele não é apenas um homem, ele
é uma idéia, e o que ele está dizendo e fazendo importa mais do que
saber quem ele é", diz Weaving.
Para Portman, o apelo do trabalho ia além de se sentir liberada
pela chance de raspar a cabeça.
"Essa é a primeira vez que tive a
sensação de que as pessoas estão
assustadas comigo", disse ela.
Segundo a atriz, no contexto do
filme, o grandioso edifício não representa mais a democracia e a
abertura, mas a repressão e a corrupção. "Mesmo que eu não acredite que aquilo está certo, se trata
de uma destruição simbólica. As
pessoas expressam inquietação e
reagem à violência destruindo
símbolos". Os espectadores sairão
refletindo sobre o significado de
tudo aquilo que viram, afirma
Portman. Mas ela oferece uma
possível interpretação: "É um final esperançoso, porque a revolução enfim chega".
Tradução Paulo Migliacci
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