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Rascunho dos fragmentos de um fim de século
ARNALDO JABOR
da Equipe de Articulistas
Está feia a coisa. "Something
wicked this way cometh" (Shakespeare). Tradução: "Vem
merda por aí!..." A sensação de
que uma coisa espantosamente óbvia está finalmente aparecendo. Estão se juntando as
cabeças de três bestas do apocalipse: a crise privada de um
homem, a queda geral da economia e a grande ruptura entre o Oriente e o Ocidente. Os
espermatozóides do Clinton,
quebra das Bolsas, bárbaros
versus "civilizados". Está vindo a furo a loucura acumulada. Um reprimido sexual republicano destrói o narcisismo
sexual de um democrata.
O sêmen de Clinton no vestido de Monica. A humilhação
do líder mundial, descrevendo
o que considera "relação imprópria", anos depois da revolução sexual dos 60. Imagens
em nossa fantasia: Clinton e
Monica no Salão Oval, sob os
olhos de Jefferson e Washington, fazendo sexo sem se tocar,
para não cair na definição oficial. O fim da ambiguidade de
um "babyboomer", a crise financeira mundial saindo de
dentro da vagina histérica de
uma burguesinha medíocre.
Assim como a morte de Kennedy foi a dessacralização da
presidência pela tragédia, este
episódio é a desmoralização
da América pelo ridículo. A
maior nação do mundo se sujando a si mesma, numa espécie de punheta a céu aberto, a
mão direita destruindo a mão
esquerda. A estranha ligação
entre pau e foguetes, entre vagina e guerra. As "modernas"
reformas democráticas, da
"globalização" da economia,
do "livre mercado" caindo por
terra por causa da boca deslumbrada de uma perua.
Milionário saudita maluco,
na "caverna do morcego" com
Internet, comandando grana
em bancos suíços. Bomba nuclear islâmica sendo comprada
na Rússia a preço de banana.
Cabeças rolam na Argélia, turistas decapitados no Egito. O
fim do sonho americano,
transformado em piada americana. Nostradamus vestido de
palhaço, de saiote curto e
manchado de porra, com nariz
vermelho de Clinton, rebolando e gritando feito uma louca:
"a 2000 não chegarás!"
Vinte e três babacas se masturbando no "grand jury"
diante do filmezinho do porno-capitalismo. A infinita superficialidade moral dos americanos aparecendo de repente
em plena "vitória". O herói vira babaca. A vitória dos puritanos sobre os iluministas. O
fundamentalismo americano
de um lado e o fundamentalismo islâmico de outro. Analisar
a América de duas cabeças: o
iluminismo dos "founding fathers", a influência de Montesquieu e Locke na formação
americana e a reação dos puritanos reacionários filhos de
Andrew Jackson, Truman,
Wallace, Goldwater.
A vingança de Nixon. Um
presidente simpático e democrata é obrigado a virar um
"hawk" (falcão) para se salvar.
A evidência de que "boa-pracismo" e flexibilidade não funcionam diante dos vorazes interesses corporativos. A "corporate America" não tolera
multiculturalismos ou humanismo. A América corporativa
é realmente o demônio, os islâmicos estão certos neste ponto.
A imensa estupidez por detrás
da eficiência.
Sequência sinistra: Monica
chupa Bill, Kenneth Starr descobre tudo. Congresso republicano veta mais verbas para
FMI.
Derrocada na Rússia miserável com 40 mil bombas. Japão,
China, tudo explode. Tragédia
econômica mundial motivada
pelo moralismo mais rasteiro e
vagabundo. "Blow job" vira
"blowback". Clinton revigora
pau humilhado com foguetes
Tomahawk. Um pensamento
chulo: quem Clinton vai comer
agora? Hillary, nem pensar.
Outras mulheres, "bimbos" e
estagiárias, perigo total.
Terrível fim de século: presidente americano se masturbando de noite no Salão Oval,
enquanto mísseis caem no Islã.
Bandeiras americanas sendo
queimadas enquanto Linda
Tripp, a besta do apocalipse,
comemora 1 milhão de exemplares vendidos. A língua de
Monica uniu os terrorismos
muçulmanos. Israel é destruída por causa de Starr, empregado dos lobbies dos planos de
saúde, do tabaco, dos racistas
do sul, de Jim Johnson, a vingança de Arkansas, de Little
Rock, onde negros eram queimados vivos como os sudaneses sob os foguetes inteligentes.
A inveja do pênis de Clinton,
a vingança das mocréias de direita contra o presidente galã.
O belo Reagan foi tolerado por
ser reacionário. A vingança
dos caretas, contra o sax, a
maconha, as mulheres de Bill.
A inveja do mundo emergente
para com o progresso americano. O despreparo dos EUA para lidar com a diversidade cultural do mundo. O solene desentendimento dos EUA para
com a importância de sua liderança. A impotência dos onipotentes diante de tanto poder.
A hora de pagar a conta por
Nova York e pelas "vitórias" da
civilização americana. O sentimento de culpa de ser o maior
e mais rico. Um país de "winners" virando "losers" no fim.
O filme de horror que Hollywood não previu: não um asteróide, mas um "espermatozóide do apocalipse". A frase profética de Elliot de que o mundo
ia acabar "com um gemido".
Gemidos de Monica e Clinton.
O "bang" dos foguetes. "Whimper and bang". "Bang", em gíria, também é "foda". A proximidade do sexo e morte, Aids
primeiro, morte e amor; agora,
bombas e esperma. O ontogenético e o filogenético se encontram no fim do túnel.
Finalmente a grande guerra
da estupidez humana: de um
lado a barbárie suja e teocrática do Oriente lutando contra a
estupidez "clean" dos puritanos fundamentalistas americanos. Argelinos, indianos, líbios, iraquianos, afegãos imbecis quebrando a banca do racionalismo ocidental. A barbárie fanática revelando a barbárie ridícula. Quantos malucos de "djelaba" medieval não
estarão agora preparando
bombas de antrax para soltar
na Broadway?. "Give my regards to Broadway", canta o
fanático do jihad particular...
O fim das palavras. Fim da
"democracia", fim da "razão",
fim da "liberdade", fim da
grandeza, fim da arte, fim da
esperança. Crise do capital começa com crise conjugal. Todas as belezas da filosofia afogadas num jato de esperma. É
a lama, é a lama. O fim da modernidade. Os computadores
estavam certos, no ano 2000
devemos pular para 1900. A
desesperança do articulista: escrever para quê? Ataques especulativos na Venezuela rondam o Brasil, com déficit público de 8% do PIB. Filmar para quê? Nada adianta.
Vontade de vomitar.
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