UOL


São Paulo, quinta-feira, 25 de setembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ARTES

Com produção gráfica impecável e tradução caprichada, obra traz seção sobre impacto das conquistas napoleônicas no Brasil

Catálogo vê devoção francesa por Napoleão

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Mesmo alguém tão britânico como Sir Arthur Conan Doyle (1859-1930), criador do detetive Sherlock Holmes, tinha fascínio pela França napoleônica. Conan Doyle tem também um personagem bem menos conhecido que Holmes, o oficial de cavalaria francês Gerard, extremamente fiel ao imperador Napoleão 1º e protagonista de dois romances.
O maior conhecedor das campanhas napoleônicas hoje é provavelmente o historiador militar David Chandler, também britânico.
Se nas ilhas que mais ferrenhamente se opuseram ao primeiro imperador dos franceses é possível achar admiradores desse calibre, fácil é imaginar o culto devotado a Napoleão Bonaparte (1769-1821) na França.
O catálogo da exposição "Napoleão" é um bom exemplo dessa devoção. Basta ver que o primeiro conjunto de imagens -um dos maiores- , entre as páginas 68 e 131, se intitula simplesmente "A Glória".
A era napoleônica tem na França o mesmo "status" que as Grandes Descobertas têm em Portugal -o momento histórico no qual o país mais influenciou os destinos do planeta.
Mas assim como há quem critique a expansão imperial portuguesa, lembrando fatos como o massacre dos índios brasileiros ou a feroz cruzada contra muçulmanos na Ásia e África, Napoleão também é um alvo de críticas severas.
O adjetivo "bonapartista" é usado para designar um militar salvador da pátria que toma o poder. Quando se lembra que sua solução para a "ralé" parisiense foi um golpe de metralha, é fácil de entender porque a esquerda detesta o pequeno imperador.
Glorificar a mortandade que as guerras napoleônicas provocaram não é, portanto, politicamente correto. A exposição e o catálogo procuram mostrar outras facetas desse período histórico que leva o nome de um "homem excepcional", na definição de Thierry Lentz, curador geral da exposição e diretor da Fundação Napoleão.
"Foi na época de Napoleão Bonaparte que surgiu um Direito novo, apoiado na Declaração dos Direitos do Homem de 1789 e no Código Civil de 1804, que acabou por conquistar, desta vez de modo pacífico, uma grande parte do mundo", escreveu no prefácio o consultor científico da exposição, Bernard Chevallier.
Esse "homem excepcional" começou a carreira como um obscuro oficial de artilharia. Nascido em uma ilha italiana recém anexada pela França, a Córsega, ele foi batizado Napoleone Buonaparte. Afrancesou o nome para seguir a carreira militar na França. A Revolução Francesa (1789) e as guerras consequentes fizeram sua carreira decolar. Seu gênio militar fez com que se tornasse general de brigada aos 24 anos de idade.
A exposição e o catálogo incluem objetos ligados às campanhas militares, mas também à "arte de viver" durante o império, à clássica expedição ao Egito que revelou essa antiga civilização aos europeus, à sua segunda mulher, Maria-Luíza, e ao seu exílio e morte na remota ilha de Santa Helena, no Atlântico Sul.
Há também uma interessante seção sobre o impacto das conquistas napoleônicas no Brasil. Indiretamente, Napoleão apressou a independência do país, pois a conquista francesa de Portugal fez com que a corte viesse para o Rio de Janeiro em 1808. Tornado a sede da monarquia portuguesa, o país tornou-se maduro para o filho do rei decretar sua independência em 1822.
A tradução é caprichada -como o texto é bilíngue, fica fácil apanhar erros. Alguns pequenos passaram, como a errada tradução de "armée" por "armada", quando o certo é "exército".
A produção gráfica é impecável, com destaque para fotos com detalhes ampliados dos objetos que mostram como são obras de arte magníficas.
Dê-se destaque ou à glória ou ao horror, não há como ficar indiferente à epopéia napoleônica.


Catálogo da exposição "Napoleão"   
Autor: Vários entre eles Bernard Chevallier, Karine Huguenaud, Thierry Lentz e Maria Izabel Branco Ribeiro
Lançamento: Editora Faap
Quanto: R$ 300 (342 págs., edição bilíngue francês-português)



Texto Anterior: Música: Brasília Festival tenta emplacar com olhos nos anos 80
Próximo Texto: Música erudita: Um concerto bem sueco da soprano Barbara Hendricks
Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.