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ARTES CÊNICAS
Coreógrafo brasileiro apresenta em Bruxelas e Paris seus dois últimos espetáculos e volta ao país em maio
Cristian Duarte descarta excessos dos movimentos
INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA
A dança como arte das idéias: o
corpo como instrumento de reflexão -reflexão que só pode se dar,
afinal, no domínio material do
próprio corpo. Bom número de
criadores contemporâneos encontra aí seu domínio de vida,
agora que a vida mais parece ter
perdido o domínio.
É o caso do premiado coreógrafo e bailarino brasileiro Cristian
Duarte, que está em cartaz no teatro Beursschouwburg de Bruxelas. Em fins de abril, ele se apresenta também no Théatrê de la
Bastille, em Paris, com dois espetáculos: "Middle High Tones"
(2002) e "Embodied" (2003).
Duarte foi co-fundador e colaborador da Cia. Nova Dança. Recebeu vários prêmios, como o
APCA (Associação Paulista dos
Críticos de Arte), o Mambembe e
o Capes/Aparts, que patrocinou
seus estudos fora do país. Em
2000 esteve, então, na PARTS
(Performing Arts, Research and
Training Studios), uma das maiores escolas de dança contemporânea, dirigida por Anne Teresa de
Keersmaeker, na Bélgica.
Foi nessa ocasião que criou
"Middle High Tones", em colaboração com Shani Granot. Nessa
peça são postos em xeque a função e o propósito de uma performance, seja para o espectador, seja para o próprio artista. Inspirado nas idéias de Anthony Barnett,
o espetáculo aborda temas como
a independência e a liberdade da
consciência, em ambientes que
sofrem constante adaptação.
Não é de hoje esse uso de teorias
(estéticas e/ou científicas) e suas
possibilidades de tradução como
elemento organizador da coreografia. Urgências da percepção
cotidiana são dramatizadas em
urgências do movimento, da luz,
do som; um campo de fluxos dispersos faz ver com outros olhos o
cenário do mundo disperso.
Mas não é menos verdade que
uma obra coreográfica será sempre um produto empírico, de natureza imprecisa. Cristian Duarte
faz parte de uma geração de novos criadores que procura movimentos despojados, descartando
os excessos. A dança não traz propriamente respostas às perguntas
que propõe, mas, com elas, nos
resgata do estado de observador
passivo.
Co-produzido pelo Springdance Festival (Utrecht, Holanda) e
pelo Théatrê de la Bastille, pode-se dizer que "Embodied" ("Personificado") é um trabalho complementar ao "Middle...". Inspira-se
em idéias de Lakoff e Johnson, no
livro "Philosophy in the Flesh"
(1999). O corpo agora vê-se tratado como "substância": "O corpo
vira DJ de si mesmo, podendo ser
manipulado e recombinado, assim como tudo o que está à volta".
Ao público, é sugerido que "cubra
[antes] sua mente/ corpo com
plástico bolha".
No final de maio, Duarte estará
apresentando "Pressa" (1998) na
Mostra de Dança Contemporânea, da Secretaria Municipal de
Cultura, que premiou 35 grupos
paulistas, promovendo a circulação dos trabalhos. Freqüência e
velocidade são conceitos usados
ali para pensar a diferença entre
os corpos, como forma de convivência de vidas distintas.
Ao fundo, um documentário
sobre elefantes; na frente, uma
dança toda feita de apoios, quedas
e impulsos, que faz de seus gestos
algo de aparentemente livre e sem
esforço. O movimento nasce da
escuta, ou melhor, dos "estados
de escuta", que se sucedem de
acordo com uma insólita trilha
musical. "O sentido se desloca do
[que é] móvel para o observador,
que urge pela associação dos fatos
descolados -pressa." Seria só
um clichê, se não fosse a dança.
Seria só dança, se essa dança não
quisesse e não pudesse ser mais,
sempre mais, do que é.
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