São Paulo, quinta-feira, 26 de setembro de 2002

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TEATRO

Lourenço Gomes, atual pároco, não vê problema na remontagem da peça na igreja Santa Ifigênia em São Paulo

Veto é contraponto à mobilização de 92

DA REPORTAGEM LOCAL

A perspectiva de veto para a remontagem de "O Paraíso Perdido" é um contraponto à mobilização da classe teatral e, sobretudo, da ala progressista da igreja, dom Paulo Evaristo Arns à frente, então cardeal-arcebispo de São Paulo, quando da estréia do espetáculo em 5 de novembro de 92, na igreja Santa Ifigênia.
Houve pressões de grupos católicos conservadores. Antes e depois da estréia. Em forma de vigília, na frente da igreja, em Santa Cecília, ou por meio de telefone ou carta anônimos.
Num dos trechos de carta enviada ao diretor Antônio Araújo, lê-se em tom de ameaça: "V.S. [vossa senhoria] não teme pela saúde dos seus? Não teme um acidente qualquer?".
O atual pároco da igreja Santa Ifigênia, Lourenço Gomes, 49, assistiu à montagem original, dez anos atrás. "Eu me recordo bem. Era um drama existencial do ser humano quando perde o paraíso, em outras palavras, a felicidade, o bem-estar, a paz, esses valores que dão sentido e alegria à vida, e vem toda a dor, a angústia, a fadiga, a tristeza, para depois ele reencontrar o caminho de Deus", descreve Gomes.
"O Paraíso Perdido", uma releitura do poema clássico homônimo de John Milton (1608-1674), trata da expulsão do Éden, as agruras e questionamentos de um Anjo Caído.
Mediante o pedido do Teatro da Vertigem para remontar a peça na igreja, o padre Lourenço Gomes reuniu o conselho pastoral da paróquia, que, como ele, não viu problema na volta do projeto. Apesar da negativa inicial, o grupo mantém negociações com outras igrejas da cidade para conseguir o aval do arcebispo.
Na autobiografia "Ninguém se Livra de Seus Fantasmas", a ser lançada na próxima semana, a atriz Nydia Licia lembra que a montagem no TBC de "Entre Quadro Paredes", de Jean-Paul Sartre, em 1950, levou a Cúria paulistana a publicar o seguinte comunicado nos jornais, assinado pelo cônego Roque Viggiano, chanceler do arcebispado:
"Comunico aos fiéis da Arquidiocese que está anunciada a representação, num dos teatros desta capital, da peça "Entre Quatro Paredes", do romancista existencialista [Jean-] Paul Sartre, através da qual se pretende ensinar e pregar, em plena luz do dia, a prostituição da família e da juventude brasileiras. Tendo sido condenadas pela Santa Sé as obras desse autor, por imorais, os fiéis não poderão assistir, sem pecado grave, à referida representação". Eterno retorno?
(VS)



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