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"ABAIXO O AMOR"
Filme evoca nostalgia da grandeza de Hollywood
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Por que, de uma hora para
outra, começam a surgir aqui
e ali filmes que decalcam uma outra época, da América, da história
em geral e do cinema? Foi assim
com "Longe do Paraíso", que retomava o melodrama dos anos
50. É assim, agora, com "Abaixo o
Amor", que se apresenta como
homenagem às comédias de Doris Day e Rock Hudson (embora
seja, na verdade, um carbono de
"Médica, Bonita e Solteira", de Richard Quine).
Com efeito, desde a introdução,
o que o filme de Peyton Reed evoca é uma época, o início dos anos
60, quando duas coisas começam
a manifestar-se: a libertação sexual e a igualdade dos sexos.
Existe, para começar, Barbara
Novak (Renée Zellweger), autora
de um best-seller que recomenda
às mulheres uma espécie de greve
do amor. Existe, do outro lado do
ringue, Catch Block (Ewan
McGregor), jornalista de sucesso
e sedutor de mais sucesso ainda,
disposto a jogar na sarjeta a reputação de Barbara.
Inútil esconder o óbvio: eles vão
se apaixonar. Esta é a lei do gênero. O filme, no mais, não o tenta, e
esta é uma virtude: sabemos o que
vai acontecer, mas o que importa
(e pode nos divertir) é como vai
acontecer. E o roteiro de "Abaixo
o Amor" mimetiza com perfeição
as velhas comédias sexuais dos 60.
Ok. Mas, se é para ver um filme
antigo, vamos a uma locadora e
alugamos uma dessas comédias.
O que "Abaixo o Amor" traz de
novo capaz de seduzir o espectador deste século? Eis a questão.
Em primeiro lugar, traz o passado. No começo dos 1970, a América tinha nostalgia dos anos 30/40
-e um vasto ciclo de filmes nostálgicos tratou de evocá-los: eles
traziam o sentimento da pureza
perdida com a guerra no Vietnã.
Em "Abaixo o Amor", o que retorna é a grandeza de Hollywood.
O filme remete a ela com desenvoltura: o logo da Fox, a direção
de arte, a entrada da música, os
efeitos especiais -tudo ali evoca
uma época em que os filmes aspiravam assemelhar-se à vida das
pessoas comuns (ou lembrar o
que de incomum pode existir em
cada pessoa comum).
Ao mesmo tempo, desenvolve a
idéia de que, quatro décadas depois do surgimento da pílula e do
feminismo, homens e mulheres
afinal sentem as coisas do mesmo
jeito, apaixonam-se, sofrem, mobilizam-se etc. -tudo do mesmo
jeito. Assim, ao contrário da nostalgia dos anos 70, "Abaixo o
Amor" não parece nos remeter
aos velhos bons tempos, e sim
afirmar a permanência de certos
valores, independente das mudanças do tempo. É o que acontece com as relações homem/mulher que continuam tensas, no filme ou fora dele -pois, felizmente, a alteridade não foi suprimida.
É verdade que "Abaixo o Amor"
dá de barato que a sexualidade
não seria, hoje, um problema.
Discutir só isso já daria um rio de
tinta e não levaria a nada: cada
tempo tem seus mitos, o nosso é
este. E toca em frente: esta é uma
comédia que faz rir, já é bem mais
do que nada.
Abaixo o Amor
Down with Love
Direção: Peyton Reed
Produção: EUA, 2003
Com: Renée Zellweger e Ewan McGregor
Quando: a partir de hoje nos cines
Market Place Playarte, Metrô Santa Cruz
e circuito
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