São Paulo, segunda, 26 de outubro de 1998

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Motorista de ônibus britânico é indicado para o Booker Prize

The Independent
Magnus Mill, motorista de um ônibus de dois andares em Londres indicado ao Booker Prize por seu livro de estréia, 'The Restraint of Beasts'


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Magnus Mills, condutor de um ônibus de dois andares de Londres, é um dos seis indicados ao Booker Prize, o maior prêmio literário do Reino Unido, que será anunciado amanhã


DENISE BOBADILHA
especial para a Folha

De dia, ele dirige um ônibus de dois andares do bairro mais violento de Londres ao centro da cidade. À noite e nas folgas, escreve livros. Num país onde nascem novos escritores todos dias, a história de Magnus Mills, 44, poderia até passar despercebida não fosse o fato de que sua primeira obra, "The Restraint of Beasts" ("A Restrição das Bestas"), pode ganhar amanhã o maior prêmio literário do Reino Unido, o Booker Prize.
Com seus personagens violentos e estranhos, "The Restraint" conquistou a ácida crítica literária inglesa e tirou da hibernação o consagrado escritor norte-americano Thomas Pynchon, que havia décadas não comentava obra nenhuma.
Lançado no Reino Unido e nos Estados Unidos há pouco menos de um mês, o livro é atemporal e, de acordo com um crítico do "Independent", renova a língua inglesa com seu estilo seco e quase sem adjetivos.
Para efeito de comparação, o livro de Mills concorre ao Booker Prize como "O Carteiro e o Poeta" ao Oscar de 95 -é um azarão, cujo simples fato de ser indicado já vale o prêmio. Tem como concorrentes nomes como Beryl Bainbridge e Ian McEwan e dificilmente irá levar a melhor, por maiores que sejam suas qualidades.
E elas, as qualidades, não são poucas: de acordo com Pynchon, o livro é uma "maravilha cômica demente, sem expressões". "Sua rude celebração tem o exuberante poder de uma palavra mágica que seria perigosa se falada em voz alta", disse Pynchon, autor de "Gravity's Rainbow" e "V" e por muitos considerado o maior escritor norte-americano vivo. Pynchon vive recluso e "mudo" há tempos. A última vez que decidiu comentar um livro foi sobre uma obra de Anthony Burgess, já morto.
Todo o frisson ao redor de Mills não mexeu com sua cabeça -e com seu emprego. Ele continua cumprindo seus turnos e se relacionando nos círculos sociais de seus colegas da garagem de ônibus de Brixton, periferia de Londres. Não tem intenção de largar seu emprego logo, mesmo porque seu chefe entende quando tem de trocar um turno para dar uma entrevista (leia ao lado).
Antes de ser motorista, Mills colocou cercas em fazendas por seis anos. Coincidência ou não, os personagens do livro são dois rudes construtores de cerca que deixam a Escócia para trabalhar numa fazenda no sul da Inglaterra. Por onde passam, deixam corpos enterrados sob as estacas de suas cercas.
Narrada por diferentes personagens, em estranho clima de pesadelo, a história parece não ter ligação com tempo ou espaço. Ninguém explica do que são feitas ou para que servem as cercas que vão sendo construídas -se fecham uma fazenda, um campo de concentração ou uma prisão.
Se Mills for anunciado como vencedor amanhã, irá figurar ao lado de nomes como Salman Rushdie, V.S. Naipaul e Paul Scott, vencedores de anos anteriores.
Organizado pela Booker McConnel e administrado pela Liga Nacional do Livro do Reino Unido desde 1969, o Booker Prize retira de quase 200 indicados os seis finalistas. No ano passado, o prêmio foi para "O Deus das Pequenas Coisas", de Arundhati Roy.



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