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Linha do escritor liga Brixton ao centro de Londres
JAMES RAMPTON
do "Independent"
A garagem de ônibus de Brixton
nunca viu algo assim. Em agosto,
repórteres e fotógrafos saltavam
dos táxis para pegar o ônibus da linha 137, que liga o bairro ao centro
de Londres. Tudo para trocar uma
palavrinha com o motorista Magnus Mills, que parecia uma versão
intelectual de Clark Kent: o mais
comum dos homens que se transforma à noite em herói.
Para toda a Inglaterra, a história
de Mills soa como conto de fadas:um motorista de 44 anos de idade
cujo livro de estréia é vendido por
um "interessante milhão de libras"
(US$ 1,89 milhões) e já está sendo
transformado em filme.
Mas Mills não está impressionado com a febre que gerou na imprensa. Longe do sugerido 1 milhão, ele recebeu adiantamentos
de 10 mil libras (US$ 18.900) da
Flamingo, sua editora inglesa, US$
5.000 dos editores americanos, 20
mil francos dos editores franceses
e "menos de 10 mil libras" de uma
produtora, a Apocalypso Film, caso algum filme venha a ser feito.
O que muitos repórteres não repararam é que "The Restraint of
Beasts" é um sério esforço literário. Mills não fez um livro a partir
dos estereótipos das garagens de
ônibus -motoristas cheios de gírias e sotaques diferentes e inspetores violentos.
Ele escreveu sim uma comédia
negra sobre Tam e Richie, dois rudes construtores de cercas rurais
que deixam assassinato e caos pelos inóspitos lugares onde trabalham. Mills gosta de reforçar que
"não há detetives de polícia ou
hospitais ou qualquer uma dessas
porcarias que estão nos romances
atuais".
O livro tem uma simplicidade
enganadora. O autor diz que "ao
contrário da maioria dos escritores, eu não me arrisco em analisar
os sentimentos das pessoas - isso
tira metade do potencial de leitura
da cabeça". A obra tem também
uma presença de espírito que vai
sendo incinerada aos poucos. As
linhas demoram a detonar. "Eu
olhei para ela", escreve Mills, "e
percebi que por baixo de todas
suas roupas ela estava totalmente
nua."
"The Restraint of Beasts" foi indicado para o Booker Prize pela
Flamingo. Os editores gostam de
associá-lo a Kazuo Ishiguro e Paul
Auster. Um crítico chamou-o de
"um trabalho de um sinistro brilho". Os editores americanos cravaram que a obra é "Macbeth' filmada pelos irmãos Coen".
O diretor editorial da Flamingo,
Phillip Gwyn Jones, fala com entusiasmo real sobre o "extraordinariamente distinto estilo de prosa"
do escritor. "(O livro) Não é pretensioso ou tem o desagradável ar
de superioridade que muitos livros
de estréia possuem. Ele é muito
plano, o que é incomum nesses
dias. Usa poucos adjetivos ou advérbios. É reminiscente de (Samuel) Beckett e (Harold) Pinter.
Magnus é um artesão, ele parece
dirigir um ônibus como se fosse
uma arte.
"The Restraint...' tem um adorável ritmo próprio. Não existem
monólogos internos, filosofias, e
nada que conecte o livro a qualquer período ou lugar. Ele é refrescante numa época onde tantos outros livros são auto-referentes e
obcecados com rótulos. "The Restraint of Beasts' é genuinamente
diferente de tudo."
Para Mills, a perseguição da imprensa e os elogios do alto escalão
intelectual aconteceram sem deixar muitas marcas. Alto, moreno e
simpático, ele é um homem essencialmente tímido que pára para
pensar antes de responder a uma
pergunta.Tem um astuto e seco
senso de humor, muito útil desde
que sua história virou assunto nacional.
A vida de Mills nada lembra a de
outros escritores de primeira viagem. Depois de deixar sua natal
Wolverhampton Poly 20 anos
atrás, ele trabalhou durante seis
anos como construtor de cercas e
tem passado os últimos 12 anos em
ônibus. Escreveu "The Restraint..." nos últimos dois anos e
meio entre seus turnos de 9x12
(nove horas de trabalho com 12 de
folga). Talentoso corredor, ciclista
e navegador, Mills tem invejáveis
reservas de energia -pode dar
uma entrevista de duas horas de
duração depois de um turno cheio
de problemas de trânsito.
"Dirigir ônibus é apenas um emprego. A maioria dos meus amigos
na garagem tem me apoiado bastante e dito "parabéns'. Eles acham
que eu consegui um ingresso para
uma vida melhor. Conduzir um
ônibus na cidade diariamente pode parecer uma coleção de cenas
de comédia de costumes, mas na
verdade é algo muito duro de se fazer, especialmente na periferia."
"Seria ótimo não ter de trabalhar
nove horas por dia numa garagem
de ônibus. Mas você não tem liberdade se trabalha para alguém. Como escritor, você pode viver num
mundo de fantasia -"vou trabalhar mais tarde, mas tomarei meu
café da manhã primeiro'."
Mills sempre faz questão de agradecer o gerente da garagem de ônibus onde trabalha, que tem sido
"muito generoso". "Ele podia pensar que tinha todos os horários organizados e aí um dos motoristas
vira escritor e diz que não pode trabalhar em certo dia porque tem
que dar entrevista a um jornal de
circulação nacional. Mas ele afirma que não irá interferir no meu
caminho, desde que eu não tire
sarro (do trabalho). É uma boa publicidade para a companhia de
ônibus."
²
Tradução
Denise Bobadilha
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