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Nova biografia minimiza o papel do ditador, que teria baseado suas teorias ideológicas em um darwinismo vulgar e uma teoria conspiratória anti-semita
Adolf Hitler
MICHAEL BURLEIGH
do "Independent on Sunday"
Adolf Hitler (1889-1945) ganhou
uma sobrevida nos últimos anos.
Alcançou os jornais no brilhante
livro "Selling Hitler" (87), de Robert Harris, que narrava a falsificação dos diários do ditador, e agora
ressurge com "Hitler 1889-1936:
Hubris", do inglês Ian Kershaw, a
primeira biografia erudita sobre o
personagem nos últimos 20 anos.
Para o autor, a Alemanha nazista
é melhor compreendida se nos
centrarmos nos ativistas nativos
ou nos funcionários graduados
que deram efeito prático aos nebulosos esquemas do Fuhrer.
Kershaw conta que o jovem Hitler vivia de pequeno patrimônio e
usava roupas que lhe eram dadas.
Em 1909, o dinheiro de Hitler acabou e ele passou a rabiscar cartões
postais para sobreviver.
Foi nessa época que começou a
desenvolver temor pelo marxismo,
e o seu próprio fracasso foi transformado em ódio visceral pela população judia, muito expressiva no
leste de Viena.
O livro explica como alguém fadado a ser um pária social acabou
se convertendo no líder de uma
poderosa nação industrial.
Tendo fugido do serviço militar
austríaco, uniu-se ao regimento
bávaro como mensageiro. A guerra e as revoluções concomitantes
na Alemanha, Hungria e Rússia radicalizaram o ódio de Hitler.
Juntou-se a um pequeno setor da
base de Munique do Partido Alemão dos Trabalhadores, que fundia racismo a nacionalismo, tornando-se sua estrela exemplar.
Um senso de crescimento de sua
importância levou Hitler à tentativa de usurpar o comando da cindida extrema-direita alemã, participando do "putsch da cervejaria",
tentativa de golpe de Estado, em
Munique, em 1923, que foi reprimida pela polícia alemã.
A experiência deu a ele notoriedade nacional e uma temporada na
prisão de Landsberg, que serviu
para a elaboração de sua ideologia.
O relato de Kershaw do Hitler
ideólogo é sensacional. Ele admirava o dogmatismo e o fanatismo
da esquerda marxista e a Igreja Católica. Para o autor, Hitler combinava vulgar darwinismo com uma
teoria conspiratória anti-semita.
As políticas nazistas estavam
fundidas em uma forma de fé, com
Hitler atuando como messias. O
veículo para essa missão política
foi um movimento em onda que
não era nem uma entidade política
convencional, nem uma seita.
O Partido Nacional-Socialista
era um microcosmo autoconsciente do igualitarismo da "comunidade nacional" dos protestantes, que
serviu para aumentar sua atração
entre as classes sociais, mesmo
quando o apoio viesse de "pequenos homens" irritados e impotentes face aos grandes negócios, ao
trabalho organizado e a crônicos
reveses econômicos.
Uma série de crises, culminando
na Grande Depressão, que se seguiu à quebra da Bolsa de Nova
York em 1929, ajudou a aumentar
o número de alemães votantes a
abandonar a fidelidade política
existente, juntando-se ao voto de
protesto contra o sistema desacreditado de Weimar.
A depressão aumentou as filas do
desemprego e fez subir a ansiedade
da classe média sobre os comunistas, que começaram a praticar atos
clandestinos de subversão. Os nazistas puderam, então, posar como
guardiães da ordem.
A partir de 1930, os nazistas aumentaram seu apoio entre a maioria dos trabalhadores não-socialistas para cerca de 40%. Isso os levou
ao ápice eleitoral, em 1932.
Kershaw faz uma narrativa detalhada do alto grau das intrigas envolvendo dois antigos chanceleres,
Papen e Schleicher, e o círculo em
torno do presidente Hindenburg,
o dinossauro militar que não confiava em Hitler.
As rivalidades entre eles e a falta
de apoio popular que os vitimava
levaram Hitler a alcançar o mais alto posto do país em janeiro de
1933. O fundamento lógico era
que, trazendo Hitler para um gabinete conservador, seria possível
amansá-lo e expulsá-lo.
Mas com a ascensão de Hitler, liberdades democráticas foram demolidas rapidamente, com partidos rivais banidos ou dissolvidos.
Os sindicatos ganharam um grande papel. Os oponentes foram assassinados ou aprisionados.
Em 1934, homens ambiciosos
próximos a Hitler falavam sobre a
crise, ao que ele respondeu desencadeando mais terror, promovendo o assassinato de mais de 80 pessoas, incluindo o general Rohm, o
líder da SA (tropa de choque nazista), intelectuais conservadores e
membros da juventude católica.
Os beneficiários foram o exército
e os fanáticos da SS (polícia política dos nazistas). Como as vítimas
foram caluniadas como homossexuais e traidores, suas mortes não
geraram protestos.
Como diz Kershaw, Hitler tornou-se "o sustentáculo absolutamente indispensável do regime inteiro e ainda bastante ligado à máquina formal de governo".
De acordo com Kershaw, 1936 foi
o momento em que Hitler começou a acreditar em seu próprio mito. "Que vocês tenham me encontrado entre tantos milhões é um
milagre do nosso tempo! E que eu
tenha encontrado vocês é uma felicidade da Alemanha."
Tradução
Ana Maria Guariglia
Livro: Hitler 1889-1936: Hubris
Autor: Ian Kershaw
Lançamento: Allen Lane
Quanto: US$ 44,40
Onde comprar/encomendar: livraria Cultura (tel. 011/285-4033)
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