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CINEMA
"O Tronco", novo filme de João Batista de Andrade, está em festival
Faroeste à brasileira abre competição em Brasília
INÁCIO ARAUJO
enviado especial a Brasília
Definir "O Tronco" como um
faroeste brasileiro pode soar um
tanto vago. O fato é que o mais recente trabalho de João Batista de
Andrade -que abriu na quarta-feira a mostra competitiva do 32º
Festival de Brasília- passa-se de
fato no Oeste (em Goiás), desenvolve-se em torno de uma epopéia de desbravamento no início
do século e se propõe basicamente como filme de ação.
Os problemas de que trata também não deixam de ter afinidade
com os faroestes americanos. A
família Melo domina o norte do
Estado, o que significa não apenas
fazer a lei, mas exercê-la com
crueldade. O coletor Vicente Lemos (Angelo Antonio), embora
faça parte da família, não concorda com essa situação e recorre ao
governo, que envia para a região
um juiz (Antônio Fagundes) e
tropas capazes de impor uma noção menos selvagem de justiça.
A partir daí, as coisas mudam
um pouco, e o filme se afasta da
concepção clássica do faroeste,
em que o mocinho consegue impor a vitória da justiça, e se torna
mais brasileiro.
Herói patético, Vicente se verá
imobilizado entre a inépcia do Estado e o vale-tudo da, digamos,
iniciativa privada. Estado e particulares impõem, é fácil concluir, a
barbárie como modo de vida.
As óbvias semelhanças com o
Brasil atual fariam supor uma carreira comercial mais feliz para esse filme, que passou de forma meteórica em São Paulo. Fracasso injusto, pois em relação ao filme anterior do diretor, "O Cego Que
Gritava Luz", os progressos são
quase inimagináveis. Personagens de carne e osso, atores bem
dirigidos, capacidade de lançar
expectativas, sentido de atmosfera, boa exploração da paisagem
da região são virtudes a notar.
Não que tudo sejam rosas. Batista impõe um andamento excessivamente tradicional à sua trama, o que determina uma queda a
partir do segundo terço do filme,
que se consolida no terço final,
quando cede à tentação do simbolismo e ao encantamento com
a música de Tavinho Moura.
Com isso, as transições -puxadas a fusões e fusões sobre fusões-, que já incomodavam no
início, tornam-se quase tão importantes quanto as cenas de
ação, as reiterações viram prática
frequente, a virtude da síntese se
perde e o conjunto perde força.
O espectador, no entanto, tende
a reter mais as virtudes do que os
defeitos, talvez porque Batista observe seus personagens como seres humanos e não como abstrações. Não se vêem mais os combates esquemáticos entre vítimas
e carrascos, justos e injustos
-constante nos filmes do cineasta- velho militante comunista.
Agora, Batista parece tomado
por um sincero desapontamento
em relação aos destinos do país,
mas, em vez de derivar para a verborragia rancorosa de "O Cego",
opta pela observação e análise.
Em suma, apesar do título nada
sugestivo, "O Tronco" está longe
de ser um filme a ignorar.
O mesmo não se pode dizer de
"Por Trás do Pano", de Luiz Villaça, que é, em resumidas contas,
um filme teatral sobre a vida teatral, girando em torno do que será, presume-se, uma das piores
montagens de "Macbeth".
Já no primeiro dia, a fórmula do
festival (dois longas e dois curtas a
cada dia) começa a mostrar seus
inconvenientes. Boa parte da platéia -que abarrotava o cine Brasília- deixou a sala antes do final, menos em função de um desapreço pelo segundo filme do
que pelo desconforto, seja da maratona de filmes, seja do horário.
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