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ANÁLISE
Religião toma conta do horário nobre
ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA
O proselitismo religioso
tomou conta do horário nobre em emissoras de TV aberta
como a Bandeirantes, a CNT e a
Gazeta. Na Record, a pregação está confinada aos horários da madrugada.
A transmissão quase que simultânea de shows de conversão e
exorcismo em vários canais assombra.
"Encostos"
Na faixa denominada "Igreja
Universal", no CNT, um corpo feminino contorcido responde com
uma voz rouca aterrorizante às
perguntas do apresentador-médium vestido de branco.
Em tom ameaçador, não muito
diferente da falsa entrevista com
"membros" da facção criminosa
PCC no "Domingo Legal", de Gugu Liberato, um suposto demônio
que teria se apossado do corpo da
mulher declara pretensões assassinas.
Além do efeito sonoro que impede o reconhecimento da voz,
um providencial quadriculado
eletrônico oculta as feições da suposta criminosa em potencial.
Assim protegida, ela -ou a força que dela se apodera- descreve
o plano, com detalhes da arma a
ser empregada.
A performance termina com final feliz, o corpo dela liberado da
força demoníaca. Ao mesmo tempo que condena e estigmatiza, a
narrativa reconhece e legitima a
barbárie.
No programa, a inveja geraria
"encostos" que levariam à instabilidade econômica, afetiva, à
doença e à violência.
Esforço didático
Alguns apresentadores mais ousados, como o missionário R.R.
Soares, na Bandeirantes, aliam esforço didático ao pedido de recompensa.
Nesses programas não escorre
sangue. Não há imagens de revólver ou de corpos despedaçados.
Eles afirmam um conteúdo moral
que se quer "do bem", mas ele só
existe em função do reconhecimento de seu oposto: as forças
esotéricas "do mal".
Haveria uma espécie de violência conceitual capaz de explicar o
injustificável. Os termos beiram o
patético.
Só faltava alguém discutir que
"encosto" sobrenatural teria se
apoderado dos assassinos do casal de namorados Liana Friedenbach e Felipe Caffé.
Disputa
A Record vem se apoiando na
tradição: investiu em jornalismo,
comemorou o legado dos festivais
de MPB da década de 60, se aventura na seara da teleficção de produção independente e em canais
internacionais.
A rede disputa com o SBT o segundo lugar no ranking das maiores audiências, com uma grade
cujos principais horários exibem
programação laica.
É nas redes menores que o discurso heterodoxo fundamentalista-civilizador, se é que tal par de
opostos é possível, encontra terreno fértil.
Essas emissoras admitem a produção independente -de cunho
religioso-, negócio aparentemente mais lucrativo do que a publicidade.
Padre Marcelo inaugurou a versão mística da parceria entre a televisão e o cinema. Agora se
anuncia para breve o lançamento
de "Em Nome de Jesus", com Jece
Valadão, ator que nos idos dos
anos 60 produziu filmes como
"Os Cafajestes".
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