São Paulo, sexta-feira, 27 de fevereiro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CINEMA/ESTRÉIA

"LANCE DE SORTE"

Ator fala sobre semelhança da vida real e papel interpretado no filme, e projetos fora de Hollywood

Nolte expõe dependência química na tela

ROCÍO AYUSO
DO "EL PAÍS", EM LOS ANGELES

Se Nick Nolte se caracteriza por uma carreira eclética, obsessiva e bizarra, sua vida errática e extravagante não é mais do que o reflexo perfeito dessa arte.
Que imagem mais clara se poderia ter desse ator de 62 anos do que a foto policial em que ele aparece de camisa havaiana, cabelos desgrenhados e boca entreaberta que, no ano passado, desviou a atenção dos americanos da celebração do 11 de Setembro, quando o ator foi detido por dirigir sob o efeito de drogas?
Em seu trabalho mais recente, "Lance de Sorte", dirigido por Neil Jordan, Nolte encarna um conhecedor das artes e vigarista decadente que precisa superar sua dependência de drogas para dar um último golpe.
 

Pergunta - Não é um problema associar sua imagem artística a seus problemas com as drogas?
Nick Nolte -
Fui dependente toda a minha vida e que não há nada de novo que eu possa dizer a esse respeito. É uma doença bastante específica e sobre a qual acredito saber o bastante, pois passei todo o tempo correndo atrás de cientistas para que me expliquem como funciona. Sem estender-me mais sobre o assunto, direi que meu cérebro sempre quer mais, porque não sabe como relaxar, e isso torna-se um problema. Portanto, não é que eu goste de ser preso por dirigir sob o efeito de drogas, mas às vezes situações desse tipo são necessárias para que eu me dê conta do meu estado.

Pergunta - A experiência própria facilitou seu conhecimento do processo de desintoxicação?
Nolte -
É um processo duro, e por isso você é internado num hospital, mas é bastante padronizado. Eu fui a uma das melhores clínicas, a Silver Hills. Você passa 28 dias lá, divide o quarto com outra pessoa e é obrigado a lavar sua própria roupa de baixo, o que faz bem para a humildade. Você assiste a seis palestras diárias e, quatro semanas mais tarde, está limpo. É claro que o segredo do sucesso está em não recair.

Pergunta - No seu caso, o cigarro parece ser uma dependência muito mais difícil de cortar.
Nolte -
Aprendi a fumar ainda criança, e a humanidade inteira inala fumo, sob a forma de cigarros ou outra, há mais de 10 mil anos, se bem que dentro em breve vai ficar impossível fumar nos Estados Unidos. Meu espírito investigativo me leva a ser a favor de um tabaco mais puro.

Pergunta - Foi esse interesse científico que o levou, neste ano, a trabalhar numa grande produção de Hollywood como ""Hulk"?
Nolte -
Desde o momento em que Ang Lee chegou à minha casa e me disse que não sabia como fazer um filme de super-heróis e que, por isso, o que queria era fazer uma grande tragédia, ele despertou todo meu interesse. Ele é mais inteligente do que tudo isso.

Pergunta - Seus projetos mais recentes foram feitos fora de Hollywood, trabalhando agora com Neil Jordan ou com o diretor norueguês Hans Peter Molland em "Beautiful Country". Por quê?
Nolte -
Fora de Hollywood não existe o "star system" que tanto pesa, no qual tudo gira em torno dos astros e estrelas. As criações de Hollywood não passam de produtos enlatados que não parecem nem sequer precisar de roteirista.


Tradução de Clara Allain


Texto Anterior: Erika Palomino
Próximo Texto: Crítica: História e atores compensam maneirismos de Neil Jordan
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.