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Festival Pan-Africano de Cinema e TV abre hoje em Burkina Fasso; mobilizações políticas devem marcar o evento
Festival tenta superar conflitos na África
LÚCIA NAGIB
enviada especial a Burkina Fasso
O Fespaco, Festival Pan-Africano de Cinema e Televisão de
Uagadugu, em Burkina Fasso,
abre hoje sua 16ª edição no momento em que completa 30
anos de idade.
Evento bienal, realizado nos
anos ímpares, o festival, embora quase desconhecido no circuito do cinema mainstream, é
o principal acontecimento cinematográfico do universo
africano e negro em geral, alcançando dimensões comparáveis às do festival de Cannes.
A cada edição são cerca de
5.000 convidados, entre jornalistas e personalidades do mundo cinematográfico que invadem a pobre e poeirenta Uagadugu, capital de Burkina Fasso.
Pode-se imaginar a metamorfose pela qual passa a cidade e
mesmo o pequeno país, encravado no Sahel, ao sul do Saara,
sem saída para o mar, com apenas um rio importante, o Volta,
e uma economia essencialmente de subsistência.
O cinema parece se tornar o
centro de todas as atividades locais
já a partir da grandiosa abertura,
realizada no estádio de futebol da
cidade, com a presença de cerca de
20 mil espectadores, dentre os
quais, segundo o costume, o próprio presidente da República, Blaise Compaoré.
Este, aliás, embora se declare socialista, surge em grande estilo, envergando luxuosos trajes típicos e
seguido de sua entourage como
um verdadeiro imperador.
Tem início então uma festa de dimensões inusitadas, em vários aspectos semelhante a um carnaval
do cinema. Na abertura, apresentam-se conjuntos de música e dança da África inteira e, ao longo da
semana, as ruas são tomadas por
uma interminável feira de artesanato e por grupos de percussão e
malabarismo.
Perto do encerramento, ocorre
um tradicional desfile de modas
no qual se apresentam as principais figuras do design negro.
É verdade que, este ano, as razões
para alegria serão escassas.
O presidente Compaoré, no poder desde 1987 quando seu antecessor foi misteriosamente assassinado, causou indignação e violentos protestos de massa ao ser "reeleito", em dezembro último, num
pleito em que somente o seu partido foi autorizado a concorrer.
No entanto, como afirmam as
autoridades diplomáticas de Burkina Fasso, o Fespaco não pertence
a um só país, mas a toda África, estando sua realização assegurada
-embora mobilizações políticas
tendam a ocorrer ao longo do
evento.
A política, na verdade, está na
raiz do Fespaco, que surgiu em
1969 como fruto direto dos movimentos de independência das antigas colônias européias.
Com ele afirmou-se também um
cinema feito pelos próprios africanos, que até então praticamente
não tinham tido acesso a uma câmera. Burkina Fasso -que, nas
línguas dos povos mossi e dioula,
predominantes no país, significa
"terra dos homens íntegros"- é o
nome que o antigo Alto Volta ganhou em 1984.
O Fespaco é competitivo e premia várias categorias de filmes, vídeos e produções televisivas. A
obra vencedora da competição
principal, compreendendo 20 filmes africanos (inclusive do Magrebe) de ficção, é agraciada com o
troféu Garanhão Yennenga. Recebe também um prêmio em dinheiro que, desta vez, incluirá uma ajuda de 15 mil dólares como auxílio-distribuição, já que a tônica do festival será o incentivo à distribuição
de filmes na África.
Nesta categoria, são vários os nomes famosos. O mais cotado deles
é certamente o do diretor malinês
Cheick Oumar Cissoko -já ganhador do Yennenga em 1995 com
"Guimba"-, que finalmente
apresenta seu tão esperado "A Gênese".
Primeira verdadeira superprodução da África subsaariana, o filme trabalha o tema bíblico da criação do mundo combinando três
crenças básicas: a cristã, a judaica e
a muçulmana.
A pretensão megalômana se estende ao cenário, que envolveu a
contratação dos principais artistas
e artesãos do Mali e a construção
de uma cidade cenográfica inteira
no desértico e belo país Dogon, ao
norte do rio Níger. Dentre os protagonista, encontram-se ainda estrelas como o músico Salif Keita,
no papel de Esaú.
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