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LIVROS/LANÇAMENTOS
"CLARICE LISPECTOR"
Psicóloga deixa lendas de lado e concentra sua análise em quatro romances-chave da escritora
Estudo enfeixa os vários caminhos da poeta
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Numa época em que a prosa
de ficção brasileira parece
reduzida, seja a uma literatura de
testemunho ou "denúncia", seja
às fórmulas do entretenimento fácil, nada melhor do que mergulhar na obra de uma escritora que
via seu ofício como exploração de
territórios desconhecidos do espírito humano e que, por conta dessa procura, violentou e ampliou
os limites da linguagem narrativa.
O breve "Clarice Lispector", da
psicóloga e professora de literatura da USP Yudith Rosenbaum, é
uma espécie de visita monitorada
a essa obra singular.
Embora o livro faça parte da coleção "Folha Explica", da Publifolha, sua autora declara logo na introdução que não vai tratar de
"explicar Clarice", e sim de "rastrear algumas linhas de força que
marcam sua obra".
Para apresentar esse rastreamento num espaço tão exíguo,
Yudith Rosenbaum tomou algumas sábias decisões. A primeira
delas foi não perder muito tempo
com o folclore em torno da escritora: as anedotas, a sedução, o
mistério, a bruxaria.
Só entram no livro os elementos
biográficos essenciais para a compreensão da obra de Clarice. Em
essência, sua crônica condição de
estrangeira e nômade (nascida na
Ucrânia, passou a infância no
Nordeste, a juventude no Rio e,
casada com um diplomata, morou em muitos países).
Outra opção acertada da estudiosa foi a de concentrar seu exame em algumas obras-chaves da
autora.
Deteve-se, por exemplo, em
quatro de seus nove romances
-"Perto do Coração Selvagem",
"A Paixão Segundo G.H.", "Água
Viva" e "A Hora da Estrela"-,
embora comente rapidamente todos os outros.
Nos capítulos referentes aos livros de contos, Yudith Rosenbaum destaca "Laços de Família",
"A Legião Estrangeira" e "A Via
Crucis do Corpo", que, mesmo
sendo atípico e realizado por encomenda (ou até por causa disso),
acaba revelando aspectos centrais
da personalidade literária de Clarice Lispector.
Por se tratar de uma abordagem
concisa e introdutória, a pesquisadora não pretendeu revelar nenhuma novidade radical a respeito de seu objeto. Em vez disso,
realizou uma excelente sistematização daquilo que de melhor já se
pensou sobre a obra clariciana.
Dos ensaios pioneiros de Antonio Candido e Álvaro Lins, que
tentaram no calor da hora situar o
fenômeno Clarice no contexto da
literatura brasileira, às aproximações de sua literatura com o existencialismo (operadas por Benedito Nunes), passando pelo "approach" feminista de Hélène Cixous, todas as principais viagens
propiciadas pela obra da escritora
estão sumariamente roteirizadas
no livrinho.
Um lugar de destaque nesse
conjunto de diálogos e interpretações cabe, obviamente, a especialistas muito próximas de Clarice:
Olga Borelli e Nádia Gotlib.
Em consequência dessa visada
abrangente, não é deixado de lado
nenhum dos ângulos sob os quais
a literatura da autora pode ser observada: o formal, o filosófico, o
psicanalítico, o místico.
Na verdade, Yudith Rosenbaum
nos mostra discretamente que todos esses planos se entrelaçam de
modo inextricável na escrita de
Clarice Lispector.
O mérito maior desse guia de
leitura é o de mostrar como as inquietações morais e filosóficas da
escritora -seu anseio infinito e
vão de atingir o coração selvagem
da vida- se traduzem numa linguagem que se questiona e se
reinventa a cada página.
Afinal, mais que uma mulher
misteriosa e cativante, Clarice foi
uma tremenda escritora.
Folha Explica Clarice Lispector
Autora: Yudith Rosenbaum
Editora: Publifolha (Coleção Folha
Explica)
Quanto: R$ 9,90 (111 págs.)
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