Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Cineasta francês se inspira em Fassbinder para falar de amor
JOSÉ ROCHA M. FILHO
ESPECIAL PARA A FOLHA, EM VIENA
O cineasta François Ozon queria filmar as dificuldades do relacionamento a dois. Escreveu então um roteiro, do qual não gostou. "Aí me lembrei da peça de
Fassbinder. Descobri no texto tudo o que gostaria de dizer sobre
essa dificuldade, sobre o amor como possibilidade."
Ozon falou à Folha sobre sua relação com teatro e com a peça de
Fassbinder e contou seus novos
projetos. Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
Folha - O expressão em alemão
"gotas d'água em pedras escaldantes" é usada para causas perdidas,
impossíveis. Seria o amor como
causa perdida o que Fassbinder
propõe em seu texto?
François Ozon - Quis fazer um filme sobre a dificuldade de viver
junto, de suportar o cotidiano a
dois. Queria algo muito pessoal.
Essa foi minha primeira intenção.
Escrevi um roteiro, mas não fiquei inteiramente satisfeito. Não
ia até aonde eu queria chegar.
Lembrei da peça de Rainer Fassbinder, "Tropfen auf Heie Steine". Descobri no texto tudo o que
gostaria de dizer sobre essa dificuldade, sobre o amor como possibilidade. A peça mostra como o
sexo é um exemplo de poder, sendo usado para sustentar uma relação de dominação.
Folha - Você considera ter feito
uma homenagem a Fassbinder?
Ozon - O filme foi uma grande
oportunidade de render um tributo a Fassbinder. Adoro seus filmes, o estilo de produção de baixo orçamento e a maneira como
os assuntos são conduzidos em
sua obra. Tenho a impressão de
que compreendo seus textos e
acredito que fiz uma boa transposição da peça para o cinema.
Folha - Você traduziu a peça do
original em alemão e decidiu ambientar o filme na Hamburgo dos
anos 70. Foram escolhas baseadas
em experiências pessoais?
Ozon - Parti para uma tradução
própria, porque a edição que existia na França não era muito boa.
Todas essas opções têm muito de
coisas pessoais minhas. A Alemanha foi o primeiro lugar estrangeiro que visitei e guardo muitas
lembranças dos lugares, das canções. É um país pelo qual sinto um
grande amor.
Folha - Seus filmes têm muito de
teatro. Como o cinema entra nessa
encenação?
Ozon - Adoro o teatro, apesar de
não gostar de ir ao teatro. Sendo
assim, trago o teatro para os meus
filmes. Gosto do teatro-cinema,
de filmes com essa mistura. Sinto
que é uma forma de estar mais
próximo do público. O artifício
teatral não é um sinônimo de exuberância ou maneirismos. É a tentativa de voltar à realidade.
Folha - Quais as mudanças feitas
na adaptação do filme?
Ozon - Vários diálogos e situações foram modificados. Por
exemplo, na peça, a personagem
Véra não era um transexual. Eu
considerei ser um tanto misógino
colocar uma mulher como no original.
Folha - De que maneira seus filmes são recebidos na França?
Ozon - Não é fácil para mim fazer
filmes na França, porque meus filmes não são bem recebidos. Eles
fazem mais sucesso no resto do
mundo do que no meu próprio
país. Talvez pelos ataques pesados
que são dirigidos à burguesia
francesa. Isso deve incomodar
um pouco. Algumas vezes é bom
ir atrás dos gêneros diferentes para encontrar o que se precisa. O
que não me interessa é fazer filmes sobre os conflitos pequeno-burgueses, com uma psicologia
burguesa. Por isso não tenho medo de ser rotulado de cineasta
trash. Se chamarem de trash, que
seja.
Folha - Qual seu próximo projeto?
Ozon - "Sous le Sable" é meu filme mais recente, finalizado há
duas semanas. Estréia em Paris,
no próximo dia 2 de novembro. É
mais uma história de amor, uma
história de amor complicada,
com Charlotte Rampling e Bruno
Cremer.
Texto Anterior: 24ª mostra internacional de cinema de São Paulo: Veja no que dá ir a restaurante da moda e ouvir Phil Collins Próximo Texto: Filme mostra relações de poder a dois Índice
|