São Paulo, sexta, 27 de novembro de 1998

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Ator é tão distraído quanto personagem da peça

da Sucursal do Rio

O ator Marco Nanini vive no mundo da Lua, assim como seu personagem no monólogo dirigido por João Falcão. "Cheguei ao cúmulo de ser assaltado sem perceber", conta o distraído confesso.
Na peça, Nanini interpreta um escritor metido numa desilusão amorosa que se compromete a escrever uma peça em apenas uma madrugada. Nesse meio tempo, ele faz uma reflexão sobre a vida. "O cérebro é um parque de diversões", conclui. (GA)


Folha - Seu personagem em "Uma Noite na Lua" se esforça para escrever uma peça em apenas uma noite, mas tem dificuldades para se concentrar. Você também vive no mundo da Lua?
Marco Nanini -
Sou muito distraído. Não registro datas de aniversário ou números de telefone. Cheguei ao cúmulo de ser assaltado sem perceber. Uns garotos renderam um amigo meu quando estávamos estacionando o carro em uma movimentada rua da zona sul do Rio. Saltei do automóvel e agradeci, pensando que os moleques tinham nos ajudado a manobrar.
Folha - Não é esquisito que um autor teatral, obrigado a tirar da cabeça uma infinidade de histórias, seja traído justamente por seu pensamento?
Nanini -
Esse dilema é o tema central do espetáculo, que conta a história de um homem cheio de projetos, mas que é incapaz de concretizar os próprios desejos.
Folha - Por quê?
Nanini -
O fator emocional interfere em todo momento no seu potencial criativo. O casamento entrou numa baita crise, e sua esposa, Berenice, acaba tirando o time de campo. Ele não consegue resolver a situação e, o pior, não tira qualquer proveito dela. Ao contrário, quanto mais ele tenta dar um jeito na vida, mais se complica.
Folha - O que aflige tanto o personagem?
Nanini -
Apesar do descontrole emocional, o sofrimento do personagem segue uma lógica bem racional. E o raciocínio pode nos levar ao sucesso ou ao fracasso. O cérebro é um parque de diversões, com todos aqueles brinquedos perigosos de experimentar.
Folha - O espetáculo trata da busca de objetivos inatingíveis?
Nanini -
Em termos. Eu, por exemplo, gosto de sonhar sem compromisso. Os sonhos se sustentam justamente por causa de suas impossibilidades de realização. Aliás, os melhores desejos são aqueles que nos causam imensa expectativa e a certeza de nunca serem concretizados...
Folha - Apesar disso, um desses "sonhos" tem que ser realizado no decorrer de uma madrugada. O protagonista consegue cumprir a sua promessa?
Nanini -
Mas esse é o final do espetáculo (risos). Na verdade, o fato de o personagem ter que escrever a peça em apenas uma madrugada acaba servindo para trazê-lo de volta à realidade. O final fica a gosto do freguês, mas na cabeça do personagem termina tudo em paz. Ele sobrevive ao desafio de saldar todas as suas dívidas com a própria existência.



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