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Show no Sesc Pinheiros promove diálogo entre Mozart e Oiapoque
IRINEU FRANCO PERPETUO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
No palco, um regente de origem
romena, músicos de orquestra
paulistana, índios e estudantes de
música do Amapá. A pesquisadora de música indígena Marlui Miranda promove o diálogo entre
Mozart e o Oiapoque com o espetáculo "Ponte entre os Povos".
A apresentação está sendo chamada de "etno ópera", o que explica estar sob a direção cênica do
experimentado Walter Neiva, que
já trabalhou em espetáculos líricos no Teatro Municipal de São
Paulo e no Festival Amazonas de
Ópera, entre muitos outros.
"Os índios estão entendendo
que a ópera é o ritual do branco",
diz Miranda. "O rito indígena não
é caótico, tem uma rigorosa organização. O exercício de ensaiar faz
parte da vida indígena. O ritual
não é uma coisa desarticulada; tudo é muito estruturado, como se
estrutura uma ópera."
O teatro do Sesc Pinheiros será
ocupado, ao todo, por 45 intérpretes, incluindo 20 índios de cinco diferentes etnias e 13 estudantes da Associação Musical Primavera - Escola de Música Walkiria
Lima, de Macapá. Eles atuam em
conjunto com a Camerata Atheneum, composta de musicistas da
Orquestra Sinfônica Municipal de
São Paulo, sob a batuta de Lucian
Rogulski, que nasceu em Bucareste, mas está radicado por aqui há
duas décadas.
O cerne do repertório é a música indígena, retrabalhada em arranjos de Ruriá Duprat, que também assina a direção musical do
espetáculo. "Tentei fazer um trabalho super-honesto, de manter a
música indígena como ela é e, ao
mesmo tempo, possibilitar que os
índios tocassem com uma orquestra", diz Duprat.
"O que se faz normalmente é
pegar a música indígena e tocar
por cima no estúdio. Desse jeito,
você continua distante", diz Miranda. "Aqui, a aproximação é
verdadeira. Não estamos pegando
os índios e tocando em cima do
trabalho deles e, sim, considerando os índios como músicos. A
idéia é que os dois lados façam um
exercício, e cada um tente entender o modo de o outro trabalhar."
Embora o foco seja o repertório
indígena, o roteiro do espetáculo
traz momentos de música erudita. "Não vai ter nada de Mahler",
brinca Miranda. Mas os indígenas, com seus instrumentos, em
determinado momento se unem à
orquestra na execução da mais famosa melodia de Mozart, a do
primeiro movimento da "Pequena Serenata Noturna".
"Ponte entre os Povos" é fruto
de um trabalho de pesquisa que
começou há três anos, em Macapá. Após se apresentar na capital
do Amapá, ela colocou indígenas
e alunos de uma escola de música
local para trocar experiências.
Surgiu, então, a idéia de gravar o
resultado do encontro em três
CDs, que estão encartados no livro "Ponte entre os Povos".
Bilíngüe, em português e francês, contém 33 partituras das
obras pesquisadas, além de fotos e
textos de diversos autores. Miranda teve a preocupação de anotar o
repertório indígena para que este
pudesse ser registrado na Biblioteca Nacional, no Rio, e, assim,
garantisse que os direitos autorais
fossem revertidos aos índios.
"Pela primeira vez na história,
uma entidade arrecadadora, a
União Brasileira dos Compositores, está reconhecendo os índios
como compositores", diz Miranda. "Isso é muito importante, porque, antigamente, o dinheiro era
sempre recolhido, mas não tinha
como chegar a eles. A propriedade intelectual dos índios, agora,
está totalmente protegida."
PONTE ENTRE OS POVOS.
Apresentação musical. Quando: hoje e
amanhã, às 21h; e dom., às 19h. Onde:
teatro Sesc Pinheiros (r. Paes Leme, 195,
tel. 0/xx/11/3095-9400 e 0800-118220).
Quanto: de R$ 5 a R$ 10. Lançamento do
livro "Ponte entre os Povos", com
organização de Marlui Miranda (Sesc São
Paulo, 416 págs., R$ 50). Quando: hoje,
às 21h, antes do espetáculo musical.
Mesa-redonda "Diversidade Cultural e
Direitos Autorais". Quando: amanhã, às
11h. Onde: auditório do Sesc Pinheiros.
Quanto: inscrições gratuitas, com 30
minutos de antecedência.
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