São Paulo, sábado, 28 de fevereiro de 1998 |
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice A arte contra a doença
Exposição com 39 artistas plásticos em comemoração aos 50 anos da Organização Mundial da Saúde chega a São Paulo em dezembro deste ano, depois de passar por Genebra e Nova York
MARIO CESAR CARVALHO da Reportagem Local Obras de Robert Rauschenberg, um dos precursores da pop arte, de Sol LeWitt, o criador do termo arte conceitual, e de Joseph Kosuth, um dos pioneiros da arte conceitual, estarão em São Paulo em dezembro -e não é na Bienal. O trio, que ajudou a definir a arte posterior à década de 60, integra a exposição "No Limite da Consciência", que chega ao Sesc Pompéia no dia 7 de dezembro. A mostra reúne trabalhos de 39 artistas dos cinco continentes em comemoração aos 50 anos da OMS (Organização Mundial da Saúde). "No Limite da Consciência" é a típica exposição de arte globalizada. Estréia dia 10 de maio em Genebra, vai a Nova York em setembro, chega a São Paulo em dezembro e depois vai para Nova Déli. Para quem gosta de ufanismo, é o Brasil entrando na rota das megaexposições. O projeto todo está orçado em US$ 2 milhões e é patrocinado por um laboratório farmacêutico, o Zambon. Arte e bem estar A OMS é uma espécie de Nações Unidas contra a doença. Foi fundada em 1948 para coordenar programas internacionais de saúde. Tem como objetivo "a obtenção do mais alto nível de saúde para todas as pessoas". E o que a arte contemporânea tem a ver com isso? Muita coisa, segundo Adelina von Frstenberg, presidente da Art for the World, entidade baseada na Suíça que organiza a mostra. "A arte tem a capacidade de promover diálogos de um modo que os países ou organizações são incapazes: pela mensagem poética", disse Von Frstenberg à Folha. Não é só nessa capacidade que ela está interessada. Von Frstenberg quer evocar na exposição um poder que se esvaneceu com a história: o tempo em que a cura e o encantamento da arte emanavam da mesma pessoa, seja o xamã, o pajé ou curandeiro. Pelo menos o poder de encantamento e a capacidade de captar como vai o mundo foi herdado pela arte contemporânea, segundo Von Frstenberg. É o que ela quer mostrar com a exposição. Um dos artistas que virá a São Paulo para criar seu trabalho, o índio navajo Joe Ben, é a lembrança do período em que arte e cura não estavam cindidos. Para os navajos, índios que habitam a região do Novo México, xamã e artista têm a mesma função: a de captar o mal e dissolvê-lo. Ben pinta com areia de diferentes cores. Entre os navajos, essas pinturas eram feitas para afastar doenças. Assim que a pessoa estava curada, a obra era destruída. É o que Ben faz -só que a cura é metafórica.
Implosão de divisões A inclusão de artistas como Ben e a própria trajetória da exposição -Genebra, Nova York, São Paulo e Nova Déli- indicam que tipo de política a Art for the World busca. A idéia, segundo Von Fürstenberg, é implodir as divisões de Primeiro e Terceiro Mundo e acabar com categorias como artista étnico, usada na maioria das vezes para depreciar um trabalho que não cabe nos escaninhos. A graça da exposição da OMS é misturar artistas consagrados como Rauschenberg com o trio cubano chamado Los Carpinteros. Rauschenberg é a grande arte americana dos anos 60, baseada em clichês banalizados pela publicidade. Los Carpinteros é um grupo cubano que debocha do suposto fim da individualidade no socialismo, um coletivo batizado com um nome operário para passar incólume à censura. Para mostrar que esse tipo de pregação não ficará no discurso, a Art for the World tomou algumas providências. As gravuras de artistas como o russo Ilya Kabakov e o norte-americano Sol LeWitt, em tiragens de cem exemplares, serão vendidas. O dinheiro será usado para comprar uma unidade de mamografia móvel, usada para detectar casos de câncer de mama, que será doada a algum país miserável. Um galpão que abrigará parte da exposição em Genebra terá destino similar -deve se transformar em um hospital na África. Texto Anterior | Próximo Texto | Índice |
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