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LIVRO - LANÇAMENTO
Bonassi faz poesia da gente comum
MARCELO RUBENS PAIVA
especial para a Folha
"100 Coisas" é o livro que Fernando Bonassi, roteirista, dramaturgo, colunista da Folha e autor
de "Um Céu de Estrelas" e "Crimes Conjugais", entre outros, lança hoje, em São Paulo.
Bonassi é boa gente o suficiente
para me deixar invadir o espaço
dedicado à resenha de seu novo livro para eu chorar umas pitangas.
Chorar, não. Descascar.
É triste como a crítica literária
brasileira, especialmente a acadêmica, mobiliza-se com os olhos fixos no espelho retrovisor e não
observa o ambiente em sua volta.
Poucos debatem ou estudam
obras de escritores contemporâneos, como as de Bonassi. Poucos
se arriscam a definir uma nova
narrativa, influenciada pela anônima vida urbana, que divide em
escalas sociais os tipos narrados.
O mundo mudou, o Brasil mudou e novos temas, como homossexualidade e violência urbana,
são servidos de bandeja a novos
autores. Mas a grande maioria de
alunos de pós-graduação e de teóricos literários escreve sobre escritores que já tinham se mandado
quando Bonassi nasceu.
Bonassi é uma das principais
válvulas que movimentam essa
nova literatura brasileira. Que literatura? A que desconstrói a gramática culta, imprimindo um vocabulário coloquial. Literatura
que herdou a rebeldia da poesia
concreta, que assistiu a muita TV
na infância, que vive num mundo
cada dia mais iconográfico e dá
voz à "perifa", aos esquecidos.
"100 Coisas" é uma compilação
de cem pequenos contos ou crônicas, que o autor publica na coluna "Da Rua", desta Ilustrada. Cada conto tem poucas linhas, e para contar uma história em tão exíguo espaço, Bonassi se vira como
pode, economizando palavras,
entregando-se à síntese.
Ele usa mitos notórios (Romeu
e Julieta, Maria e José) para contar
a história de gente comum: "Romeu era padeiro, porque dava salário mais pão e leite". Alguns
contos parecem bilhetes, bulas,
receitas ou anúncios. Bonassi
reescreve poemas, para expor um
Brasil nada bucólico: "Minha terra tem HK, AR15, M12, 45 e 38 (na
minha terra, 32 é piada). As sirenes que aqui apitam, apitam de
repente e sem hora marcada."
Seus personagens têm intimidade com papelotes, meganhas, picos. Muitos contos são narrados
por mulheres apaixonadas, traídas ou traidoras. São muitos universos, em tão pouco espaço. Ou
talvez seja o mesmo universo, visto por tantos ângulos.
Bonassi, como poucos, demonstra conhecer intimamente o
ofício. Seu estilo flui na direção do
resgate do pequeno cotidiano do
pequeno homem. São casos banais, que ganham a dimensão de
alta literatura.
Avaliação:
Livro: 100 Coisas
Autor: Fernando Bonassi
Lançamento: Editora Angra
Quando: hoje, às 19h
Onde: Saraiva Megastore (av. Rebouças,
3.970, tel. 0/xx/11/870-5999)
Quanto: R$ 16 (112 págs.)
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