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DISCO LANÇAMENTOS
Morphine evoca sonhos pela última vez
MARCELO VALLETTA
da Redação
Poucas bandas pop foram
tão singulares
como o Morphine. O trio,
formado em
Boston, em 1991, trazia o líder
Mark Sandman, que compunha,
produzia, cantava e tocava baixo
-geralmente com apenas duas
cordas e com o uso de "bottleneck"-, Dana Colley, que tocava
saxofones tenor e barítono -às
vezes simultaneamente- e o baterista Billy Conway.
O grupo -cuja música, sofisticada demais para ser chamada de
rock, direta demais para ser chamada de jazz, foi rotulada como
"low rock" por seus próprios integrantes- chegou ao fim em julho
do ano passado, quando Sandman morreu em consequência de
um ataque cardíaco durante um
show na Itália, aos 46 anos.
A banda havia iniciado uma pequena turnê pela Europa após finalizar as gravações de "The
Night", seu quinto álbum, lançado há dois meses nos EUA. O disco, que levou dois anos para ser
produzido, deverá sair no Brasil
pela Trama, que planeja lançar os
álbuns anteriores do Morphine.
Os remanescentes do grupo,
após organizarem uma fundação
com o nome de Sandman para estimular a educação musical para
crianças, formaram uma nova
banda para tocar as músicas de
"The Night". A Orchestra Morphine possui, além de Colley e
Conway, mais sete (!) integrantes.
O novo conjunto já se apresentou
nos EUA e deverá fazer shows na
Europa no meio deste ano.
O alto número de integrantes se
justifica, pois "The Night" é o trabalho mais complexo do Morphine. A tradicional cozinha de baixo
e bateria, complementada pelas
intervenções esparsas de Colley,
ganha aqui o reforço de arranjos
de cordas, vocais de apoio femininos, percussão, violões, piano, órgão e surpreendentes, porém discretos, efeitos eletrônicos.
A maior quantidade de informações musicais torna o disco
muito mais denso -e com menos apelo comercial- que "Cure
for Pain" (93) e "Yes" (95), por
exemplo. Mas isso não quer dizer
que a banda ficou engessada. Músicas como "Top Floor, Bottom
Buzzer" e "A Good Woman"
mostram o potencial "funky" do
Morphine, cujos shows sempre
foram energéticos.
Mas "The Night", de uma maneira geral, radicaliza o lado sombrio e romântico de Sandman,
que conduz as 11 faixas do disco
com sua voz onírica. Os tons graves são privilegiados, e os solos de
saxofone de Colley perdem espaço para as cordas. A bateria torna-se mais compacta, e órgãos permeiam a base das canções.
Um violão flamenco surpreende em "Rope on Fire". "Like a
Mirror" é hipnótica, o refrão é repetido como um mantra. "The
Way We Met" é seca, com a percussão em primeiro plano.
As letras continuam falando de
relacionamentos amorosos. Imagens interessantes se formam, como "Eu sou como um espelho/
Não sou nada até que você olhe
para mim" ("Like a Mirror") ou
"Silhuetas de nós dois subindo/
Subindo por uma corda em chamas" ("Rope on Fire"). Outras
são simples, como "Não me deixe
sozinho/Não posso viver sem você/Leve-me quando você for embora" ("Take Me with You") ou
"Espero que você esteja esperando por mim/Porque não posso ficar sozinho" ("The Night").
Sandman dizia que o nome
Morphine veio de Morfeu, deus
dos sonhos, filho de Hypnos, deus
do sono. Todas essas informações
tornam-se paradoxalmente claras
ao escutar "The Night", o crepúsculo de um pequeno sonho que
chegou ao fim.
Avaliação:
Disco: The Night
Artista: Morphine
Lançamento: Dreamworks (importado)
Quanto: R$ 40, em média
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