São Paulo, terça-feira, 28 de março de 2000


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DISCO LANÇAMENTOS
Morphine evoca sonhos pela última vez

MARCELO VALLETTA
da Redação


Poucas bandas pop foram tão singulares como o Morphine. O trio, formado em Boston, em 1991, trazia o líder Mark Sandman, que compunha, produzia, cantava e tocava baixo -geralmente com apenas duas cordas e com o uso de "bottleneck"-, Dana Colley, que tocava saxofones tenor e barítono -às vezes simultaneamente- e o baterista Billy Conway.
O grupo -cuja música, sofisticada demais para ser chamada de rock, direta demais para ser chamada de jazz, foi rotulada como "low rock" por seus próprios integrantes- chegou ao fim em julho do ano passado, quando Sandman morreu em consequência de um ataque cardíaco durante um show na Itália, aos 46 anos.
A banda havia iniciado uma pequena turnê pela Europa após finalizar as gravações de "The Night", seu quinto álbum, lançado há dois meses nos EUA. O disco, que levou dois anos para ser produzido, deverá sair no Brasil pela Trama, que planeja lançar os álbuns anteriores do Morphine.
Os remanescentes do grupo, após organizarem uma fundação com o nome de Sandman para estimular a educação musical para crianças, formaram uma nova banda para tocar as músicas de "The Night". A Orchestra Morphine possui, além de Colley e Conway, mais sete (!) integrantes. O novo conjunto já se apresentou nos EUA e deverá fazer shows na Europa no meio deste ano.
O alto número de integrantes se justifica, pois "The Night" é o trabalho mais complexo do Morphine. A tradicional cozinha de baixo e bateria, complementada pelas intervenções esparsas de Colley, ganha aqui o reforço de arranjos de cordas, vocais de apoio femininos, percussão, violões, piano, órgão e surpreendentes, porém discretos, efeitos eletrônicos.
A maior quantidade de informações musicais torna o disco muito mais denso -e com menos apelo comercial- que "Cure for Pain" (93) e "Yes" (95), por exemplo. Mas isso não quer dizer que a banda ficou engessada. Músicas como "Top Floor, Bottom Buzzer" e "A Good Woman" mostram o potencial "funky" do Morphine, cujos shows sempre foram energéticos.
Mas "The Night", de uma maneira geral, radicaliza o lado sombrio e romântico de Sandman, que conduz as 11 faixas do disco com sua voz onírica. Os tons graves são privilegiados, e os solos de saxofone de Colley perdem espaço para as cordas. A bateria torna-se mais compacta, e órgãos permeiam a base das canções.
Um violão flamenco surpreende em "Rope on Fire". "Like a Mirror" é hipnótica, o refrão é repetido como um mantra. "The Way We Met" é seca, com a percussão em primeiro plano.
As letras continuam falando de relacionamentos amorosos. Imagens interessantes se formam, como "Eu sou como um espelho/ Não sou nada até que você olhe para mim" ("Like a Mirror") ou "Silhuetas de nós dois subindo/ Subindo por uma corda em chamas" ("Rope on Fire"). Outras são simples, como "Não me deixe sozinho/Não posso viver sem você/Leve-me quando você for embora" ("Take Me with You") ou "Espero que você esteja esperando por mim/Porque não posso ficar sozinho" ("The Night").
Sandman dizia que o nome Morphine veio de Morfeu, deus dos sonhos, filho de Hypnos, deus do sono. Todas essas informações tornam-se paradoxalmente claras ao escutar "The Night", o crepúsculo de um pequeno sonho que chegou ao fim.


Avaliação:     


Disco: The Night
Artista: Morphine
Lançamento: Dreamworks (importado)
Quanto: R$ 40, em média


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