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Ópera esquentou búlgaros
CASSIANO ELEK MACHADO
da Reportagem Local
Fazia 3º C quando a versão completa da "Fosca", de Carlos Gomes, foi encenada na íntegra pela
primeira vez, em novembro do
ano passado.
Frio para Campinas, onde o
compositor nasceu, em 1836. Muito frio para Belém do Pará, cidade
em que ele morreu, 60 anos depois.
Mas a quarta ópera do autor de
"O Guarani" foi saudada com 23
minutos de aplausos fumegantes.
Certamente os protagonistas das
palmas não as produziam por causa da temperatura.
A "Fosca" foi "levada", como
dizem os seguidores da música
erudita, no teatro da Ópera Nacional da Bulgária, em Sófia.
Termômetros marcando 3º C
não assustam búlgaros. E foram
800 deles que aplaudiram com calor a montagem.
Uma delas foi a professora de filologia Maria Velikin. Trajando
um tailleur escuro, mas de tecido
leve, a búlgara explicou que "O
Guarani' é excelente, mas soa
muito italiano, muito próximo de
Verdi. "Fosca' tem elementos originalíssimos".
Foram esses temperos "peculiares" que esquentaram os 3º C da
Bulgária e que aquecem hoje o outono de São Paulo, no Teatro Municipal.
Não se pode dizer que essa beleza que a professora búlgara notou
seja brasileira.
Como dizia o próprio Carlos Gomes, sobre as suas três óperas mais
famosas, "O Guarani' era para
os brasileiros, "Salvador Rosa'
para os italianos e "Fosca' para
"os entendidos'".
A montagem "globalizada" da
ópera, com camarins nos quais se
fala italiano, português, búlgaro e
inglês, talvez tenha contribuído
para que ela não ficasse restrita ao
círculo dos especialistas.
Mário de Andrade escreveu que
"a "Fosca' representa, dentro da
obra do campineiro, o talvez único momento em que ele pretendeu
avançar acima de si mesmo, e
avançar em arte além do ponto em
que jazia a italianidade sonora do
tempo".
Poucos questionam que a obra
de Gomes representou alguns saltos linguísticos no vocabulário da
ópera, quando ela estreou e foi recebida com frieza no Scala de Milão, em 1873.
Mas os ouvidos dos espectadores
da saga da pirata corsária Fosca
não são obrigados a pular por conta disso.
É o que mostra o calor dos
aplausos de 800 búlgaros em uma
noite de 3º C.
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