São Paulo, segunda, 28 de setembro de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Morre Betty Carter, a radical do jazz

CARLOS CALADO
especial para a Folha

A cantora norte-americana Betty Carter morreu anteontem, aos 68 anos, vítima de câncer no pâncreas, em Nova York. O jazz perde uma de suas intérpretes mais radicais e inovadoras.
Clubes de jazz nova-iorquinos, como o Blue Note e o Birdland, renderam homenagens póstumas à cantora, pedindo minutos de silêncio a seus frequentadores.
"Vamos sentir falta dela. Ela era uma cantora maravilhosamente inovadora e inventiva", disse ontem a intérprete de jazz britânica Annie Ross, do influente trio vocal Lambert, Hendricks & Ross.
Nascida em Flint (no estado de Michigan), em 16 de maio de 1930, Lillie Mae Jones (seu nome verdadeiro) estudou piano no Conservatório de Música de Detroit.
Aos 16 anos venceu um concurso de amadores. Pouco depois, estreou como cantora. Sua estréia como profissional foi ao lado do saxofonista Charlie Parker, em Detroit. Falsificou a data de nascimento, na cédula de identidade, para fugir da proibição a menores de idade em clubes noturnos.
Atuando como vocalista da orquestra do vibrafonista Lionel Hampton, entre 1948 e 1951, despertou atenção na cena jazzística.
Foi uma defensora radical do "bebop" -o estilo de jazz moderno criado em meados dos anos 40, por uma geração de músicos inovadores, como Charlie Parker e o trompetista Dizzy Gillespie.
Graças a essa inclinação musical, recebeu de Lionel Hampton o apelido irônico de "Betty Bebop" (que virou sua marca registrada) e foi demitida da orquestra.
Dai em diante, começou a se apresentar em clubes, especialmente em Nova York, onde se radicou. Um de seus discos mais famosos, foi gravado com o cantor e pianista Ray Charles, em 1961.
Avessa a concessões comerciais, Betty amargou um período de semi-ostracismo, nos anos 60, época em que chegou a suspender a carreira para cuidar dos dois filhos.
Ao retornar aos palcos, em 1969, fundou seu próprio selo fonográfico, o Bet-Car, pelo qual gravou vários discos, incluindo o elogiado "The Audience with Betty Carter", premiado com o Grammy.
Improvisadora excepcional, Betty foi das maiores cultoras do "scat singing", a vocalização sem o uso de palavras, só com sons onomatopaicos. Até mesmo ao improvisar canções conhecidas, transformava-as em algo novo.
Nos últimos 10 anos, depois de assinar contrato com o selo de jazz Verve, começou a gravar com mais regularidade e seus álbuns antigos foram relançados.
Também ficou conhecida como reveladora de talentos. Por suas bandas passaram instrumentistas hoje bem conhecidos, como os pianistas Cyrus Chestnut, Jacky Terrasson e Mulgrew Miller, ou os bateristas Lewis Nash, Kenny Washington e Wynard Harper.
Betty Carter esteve várias vezes no Brasil. Apresentou-se no Free Jazz Festival de 93 e fez temporada no antigo 150 Night Club, em São Paulo, em 1983. Chegou a ser convidada para o para o recente festival Marantz Jazz Soundz, mas já tinha suspendido os shows. O jazz deixa de contar com uma de suas estrelas mais brilhantes.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.