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MÚSICA
Paulistana radicada nos EUA foi eleita cantora do ano pela crítica especializada; novo CD traz duos com violonistas
Luciana Souza atrai Grammy com jazz em português
CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Em junho último, ela foi eleita
cantora de jazz do ano pela Associação dos Jornalistas de Jazz, em
Nova York. Três semanas atrás,
obteve sua terceira indicação ao
Grammy com "Duos II", seu sexto álbum, cuja edição brasileira
vai chegar às lojas em janeiro pela
Universal.
Radicada há duas décadas nos
EUA, a cantora paulistana Luciana Souza, 39, reafirma com esse
trabalho a proeza que alcançou
em 2002 com o CD "Brazilian
Duos": volta a figurar entre as
principais intérpretes do jazz no
país, cantando música brasileira,
em português. No ano passado,
lançou o CD "Neruda", com poemas musicados do autor chileno
vertidos para o inglês.
Luciana retoma em "Duos II" o
formato voz e violão, em parcerias com quatro violonistas brasileiros: Romero Lubambo, Marco
Pereira, Swami Jr. e Guilherme
Monteiro. No repertório, destacam-se clássicos da música brasileira assinados por Paulinho da
Viola, Nelson Cavaquinho, Chico
Buarque, Francis Hime e Nathan
Marques, entre outros. Leia a seguir entrevista com a cantora, que
comenta a indicação ao Grammy
e sua ascensão no cenário do jazz.
Folha - Por que você voltou aos
duos?
Luciana Souza - Quando gravei
"Brazilian Duos", já tinha claro
que esse projeto tinha muitas possibilidades. Aqui no Brasil há uma
abundância enorme de repertório
e violonistas com estilos diferentes. Ontem mesmo, conversando
com meu pai [o compositor Walter Santos], pensei em gravar com
o Toninho Horta, que toca lindo e
é arranjador no violão. Também
pensei no Edson Alves, grande
violonista e arranjador de São
Paulo, assim como Paulo Bellinati. Tenho vontade de cantar Zé
Ramalho, Filó, Guinga, Lenine,
muita gente.
Folha - O que um duo de voz e violão traz de especial?
Souza - Em primeiro lugar, a pureza, a possibilidade de fazer música de câmara "ao vivo", sem edição. Depois, o diálogo entre dois
instrumentos, que permite trabalhar contraponto, ritmo, harmonia, melodia, percussão com uma
pureza que você não encontra em
outras formações. O violão é um
instrumento que abre caminhos
tanto ao jazz como para a música
brasileira mais tradicional.
Folha - Os norte-americanos ainda resistem à música em português?
Souza - Menos, hoje em dia. Nos
encartes dos meus discos, tenho o
cuidado de explicar as letras das
canções, sem fazer uma tradução
literal. Não quero ser didática,
mas acho importante informar ao
ouvinte sobre o que a música fala.
Quem vai buscar um disco meu já
sabe que não vai ouvir música
pop, nem jazz "straight ahead".
Folha - Você se surpreendeu com
a terceira indicação ao Grammy?
Souza - Não tanto como da primeira vez. Não é que eu esteja perdendo o gosto da surpresa, mas
entendi que dentro da indústria
fonográfica norte-americana
existe gente que acha que o meu
trabalho é importante por valorizar o som do instrumento da cantora. Num disco de jazz, com
aquelas canções já gravadas por
todo mundo e arranjos muito rebuscados, você perde o som do
instrumento. Sinto que consegui
criar um veículo para mostrar a
evolução da minha voz, do meu
jeito de cantar.
Folha - Uma sul-americana tem
chance de levar o Grammy de melhor cantora de jazz?
Souza - Não sei. Acho que funciona como no Oscar, depende de
quem concorre com você. Chance
de ganhar até tenho, mas não tanto quanto outras cantoras que
concorrem todo ano e, devo dizer,
merecem isso. Estando dentro da
coisa, é difícil até dizer se mereço a
indicação. Fico chateada ao pensar que uma cantora como Kate
McGarry, que é maravilhosa, não
foi indicada. Talvez por eu também gravar música clássica e fazer
trabalhos com outros compositores, meu nome apareça mais para
os eleitores da Academia.
Folha - Você diria que já se estabeleceu como cantora de jazz?
Souza - Quando você não vende
1 milhão de discos, acha que está
num vácuo, que você não existe.
Faço shows em lugares ótimos,
viajo pelos Estados Unidos, canto
na Europa, mas não cheguei ao
nível de Diana Krall ou Dianne
Reeves. Ainda não tenho um
DVD nem um disco feito por uma
grande gravadora. Ainda estou na
fase da batalha.
Folha - Pela primeira vez um CD
seu será distribuído fora dos EUA
por uma grande gravadora. Isso
ajuda?
Souza - É um grande passo, que
me permite ter uma presença internacional. Isso também deve reduzir o preço do meu disco nos
outros países. Aliás, já acho caro
um disco meu vendido a US$ 12.
A gente sabe quanto custa a produção de um disco hoje em dia.
Tem gente que gasta meio milhão
de dólares para fazer um disco. Os
meus são gravados "ao vivo", em
um dia. Um disco feito assim não
precisa custar mais de US$ 8.
Folha - Quando você sentiu que
passou a ser realmente valorizada
nos EUA?
Souza - A entrega do prêmio da
Associação dos Jornalistas de
Jazz, em junho, significou mais
para mim até do que a indicação
ao Grammy. Ser reconhecida por
uma associação de 450 críticos
dos EUA, sem cantar exclusivamente em inglês nem fazer um
trabalho centrado em "standards", me leva a acreditar que essas pessoas escutam o que eu faço.
Folha - Já tem planos para um novo disco?
Souza - Eu queria fazer um disco
de jazz com o trio que tem tocado
comigo, mas depois pensei que
seria melhor esperar pela repercussão da indicação ao Grammy.
Meus projetos sempre foram pensados, feitos e tocados. Agora estou pensando em inverter esse
processo, até porque minha vida
está mudando, vou morar em Los
Angeles. Quero que a vida me
mostre o que fazer.
Carlos Calado é jornalista e crítico musical, autor de "O Jazz como Espetáculo",
entre outros livros
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