São Paulo, quinta-feira, 29 de março de 2001

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RELÂMPAGOS

Voluntário

JOÃO GILBERTO NOLL

Uma da tarde. Numa dedicação sem objeto, lá ia ele ladeira acima, distribuindo laivos do olhar de enfermeiro. Muitos mastigavam porções condensadas de saliva, em cacoete epidêmico... Engoliam, sim, essas balas de nuvens do palato, a imaginar o que seria delas quando, maceradas, chegassem ao estômago, ao intestino grosso, à masmorra dos esgotos... Ele ia na calçada do sol com um balde, uma toalha, pronto para o socorro que nunca acontecia. O silêncio o instigava a derramar a água na cabeça. E agora, como voltar, como seguir, ficar? Molhado, a mão a um palmo da fronte, o anular e o mínimo encolhidos. Pontífice da periferia. Empedrado na sua bênção secular. A sombra que ele lançava parecia o perfil de um agonizante vendo o que ninguém mais via...


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