São Paulo, sexta-feira, 29 de março de 2002

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FESTIVAL DE CURITIBA

"O AUTO DOS BONS TRATOS"
Diretores Márcio Marciano e Sérgio de Carvalho não repetem sucesso conseguido antes

Latão usa monocórdico contra o cordial

SERGIO SALVIA COELHO
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA

A Companhia do Latão apresentou uma montagem inacabada na Mostra Contemporânea. Sem vitalidade e com um didatismo reducionista, fez o público debandar do teatro na estréia. O fato não seria desabonador para um grupo que se lançou justamente a partir do conceito de ensaio aberto (o consagrado "Ensaio sobre o Latão"). Mas não se pode ser condescendente com o Latão por duas razões.
Primeiro porque, ao se nortearem por importantes questões políticas (a estrutura do poder em vários momentos históricos do Brasil), os diretores Márcio Marciano e Sérgio de Carvalho costumam ostentar um certo menosprezo por outras linhas de teatro que não adotam as mesmas prioridades e as mesmas técnicas brechtianas "ortodoxas". Exercendo episodicamente a função de críticos, como se considerassem mera diversão burguesa tudo o que não pertencesse ao teatro que escolheram. Não podem pois contar com a generosidade que não têm para com os outros.
Depois, e sobretudo, não se pode aceitar tão pouco de um grupo que tem tantos trunfos. Ney Piacentini, Heitor Goldfuss e Marcos de Andrade são excelentes atores, que dominam com humor e precisão o "gestus" brechtiano, técnica que permite caracterizar instantaneamente, só com a postura e gesto, não só as personagens na fábula mas sua função na estrutura social retratada. O cenário de Antônio Marciano é elegante e altamente funcional. O texto dos diretores tem momentos de ironia afiada e uma fluência que, às vezes, se torna poética.
O problema é que o texto é um verniz que dá brilho a uma maciça e enfadonha "tese", que paralisa os atores e obriga Helena Albergaria, atriz de delicadeza desperdiçada, a impostar a voz para atingir as massas, nessa altura já anestesiadas pelo monocórdico canto (brechtiano?).
A propósito: a desinteressante trama procura, com ingênua empáfia, fazer o público duvidar da tese de que o brasileiro é cordial. Não estivesse o público tão mal acostumado com as "diversões burguesas", aprenderia a lição -isto é, tivesse ele a cordialidade de não dormir, e ficar até o fim.


Avaliação:  

O crítico Sergio Salvia Coelho e o jornalista Valmir Santos viajam a convite da organização do 11º Festival de Teatro de Curitiba

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