São Paulo, sexta-feira, 29 de março de 2002

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DISCO/CRÍTICA

Indignação oculta no silêncio

DA REPORTAGEM LOCAL

Jair Oliveira é um artista indignado, mas sua indignação é surda, silenciosa, muda. Musicalmente é um doce, reflexo invertido do pai explosivo. Para seguir rumo próprio, escolheu rhythm" n'blues sacudido, voz delicada, temas tranquilos e sensatos.
Mas há um forte incômodo em seu trabalho. Significativamente, "Outro" se oculta nos silêncios. O samba-rock meio samba-jazz meio samba-funk "Minuto de Silêncio" explicita isso, guardando minuto de silêncio bem no meio.
O artifício parece tolo -é-, assim como são bobinhas várias vinhetas que dão respiro ao CD. A que o inicia, por exemplo, se apega a instruir o ouvinte sobre como manipular seu aparelho de som. Ao final conclui: "Música não precisa de instruções". O insight tem impacto, mas se autoconsome na segunda audição, tal qual piada.
Por que, se o humor evidentemente não é o objetivo de Jair? O artista está provocando o ouvinte, causando-lhe desconforto, criando fundos falsos, pistas falsas (como a da "réplica" a Caetano, em canção pouco inspirada).
Em contraponto fino e sutil, as canções são mansas, às vezes meladas, outras sublimes ("Sorriso pra Te Dar", para sua mãe). Aí está a amarra do menino Jair: a provocação e a rebeldia migram da música ao silêncio, a musicalidade deriva a referências intimidadas, intimidantes. O que Jair quer falar ainda não escutamos, ele é outro. (PEDRO ALEXANDRE SANCHES)



Outro
  
Artista: Jair Oliveira
Lançamento: Trama
Quanto: R$ 20, em média




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