São Paulo, segunda, 29 de junho de 1998

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JVC JAZZ
O saxofonista James Carter e o "bluesman" Olu Dara brilham em apresentação gratuita no Bryant Park, NY
Festival termina, e seu futuro é duvidoso

CARLOS CALADO
enviado especial a Nova York

O saxofonista James Carter e o "bluesman" Olu Dara foram os destaques do concerto ao ar livre, na última sexta, em Nova York, que fez parte da programação alternativa do JVC Jazz Festival.
Patrocinado pela gravadora Atlantic, o show gratuito levou cerca de mil pessoas ao simpático Bryant Park, na 5ª avenida. Em vez da sobriedade de teatros de concerto, como o Carnegie Hall, a descontração do Bryant Park, incrustado entre os enormes arranha-céus, acaba resultando em um cenário muito especial.
Sentada confortavelmente em cadeiras de madeira espalhadas sobre a grama, a platéia lia, comia ou bebericava, enquanto esperava o início do show. Preso no trânsito, Olu Dara entrou no palco com mais de uma hora de atraso.
Sua trajetória musical é singular. Conhecido nos meios jazzísticos desde os anos 70, o trompetista só lançou disco em 98. No entanto, o CD "In the World" (Atlantic) está longe de parecer com um disco de jazz. Soa mais como o trabalho de um eclético "bluesman", já que Dara também canta, além de tocar guitarra e gaita.
Com vocais que às vezes lembram John Lee Hooker, Dara mostrou em apenas quatro números um universo musical bem amplo, que vai do jazz ao afro-pop, passando pelo blues elétrico.
A canção "Harlem Country Girl" é bem característica das misturas de Dara. A letra fala de uma garota interiorana que mora no bairro negro do Harlem, mas tanto a introdução como a coda final ganham um tom "jazzy", com o "cornet" (instrumento da família do trompete) tocado por Dara.
Também com um disco recém-lançado pela Atlantic ("In Carterian Fashion"), James Carter entrou no palco com o mesmo trio que o acompanhou no Brasil, durante o Free Jazz Festival de 96.
Tocando a composição própria que intitula o novo álbum, Carter mostrou que também aderiu à onda de redescoberta do órgão, evidente nos trabalhos mais recentes de vários jazzistas.
Mesmo assim, o saxofonista não deixa de imprimir sua marca. Cria uma caótica introdução em tom de "free jazz", antes de cair no "groove" dançante do tema. O título da composição é perfeito: até quando adere a um modismo, Carter marca seu estilo.
Mas o número de maior impacto do show foi "I Wonder Where the Love Has Gone", aplaudido aos gritos pela platéia. Fazendo uma ponte entre o jazz tradicional e a atonalidade do "free jazz", Carter não deixou dúvidas: é um dos músicos de jazz mais criativos revelados nos anos 90.
A 26ª edição do JVC Festival terminou no sábado, deixando no ar uma certa expectativa sobre a linha musical que o evento seguirá.
Com o ingresso do canal pago de TV BET (espécie de MTV da música negra) na produção do evento, há quem veja o risco de o tradicional festival de jazz abrir-se para correntes mais comerciais.
Os produtores negam qualquer mudança radical. Mas concertos com metade da lotação da sala, como os que aconteceram no Symphony Space, podem pesar no balanço desta edição. Tomara que o senso artístico vença o sentido meramente comercial.


O jornalista Carlos Calado viajou a convite da JVC do Brasil e da United Airlines


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