São Paulo, segunda, 29 de junho de 1998

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Coleção de CDs homenageia Nelson Gonçalves 20 vezes


Cantor nascido em 1919, no Rio Grande do Sul, e morto em abril deste ano, no Rio de Janeiro, tem mais 20 títulos de sua discografia relançados pela BMG, gravadora em que registrou toda a sua obra; série inclui canções gravadas entre os anos 50 e 90 e coletânea inédita


PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

Em casos de necrofilia, nem sempre gravadoras podem ser acusadas de oportunismo. A segunda leva da "Coleção Nelson Gonçalves", lançada agora, não é fruto de exploração do cadáver do cantor morto em abril. A gravadora BMG já vinha implementando o projeto de restauração da obra de Nelson Gonçalves (1919-1998), cantor nascido gaúcho, criado paulistano do Brás e carioca desde 1939 até sua morte. Em 97, havia publicado oito títulos -agora, mais 20 CDs conduzem verdadeira enxurrada. A série abarca LPs lançados no intervalo que vai de 1956 a 1992. Inclui também uma compilação inédita, "O Rei do Rádio", que não vem acrescentar muito ao todo da coleção. Embora signifique porção minoritária de sua discografia -o próprio Nelson costumava divulgar a cifra algo duvidosa de 128 LPs gravados-, a coleção fornece informação abundante sobre a história do cantor e da canção kitsch brasileira. Nelson demonstra-se um teimoso por excelência, capaz de atravessar décadas sem abrir mão de um estilo definido, logo de início, a ferro e fogo -vocais impostados, orquestrações convencionais, muita dor-de-cotovelo. Vai a extremos opostos -os tangos cafonas de "O Tango na Voz de Nelson Gonçalves", o universo elegante de Noel Rosa em "Nelson Interpreta Noel"-, sem nunca abdicar de um padrão constante. Nos dois exemplos citados, chega a resultados dos mais perfeitos de sua história. Atravessa os anos 60 primeiro ironizando a bossa nova (em "Velha Bossa Nova", do LP "Queixas"), "cafonizando-se" mais que nunca, enfrentando problemas com cocaína e polícia, trovejando o vozeirão em provocação e afronta aos bossa-novistas. Recria-se nos anos 70 -"Quando a Lapa Era Lapa" (73), "Passado e Presente" (74) e "Nelson de Hoje" (79) somam-se aos melhores títulos da coleção-, cantando samba, seresta e até -veja só- bossa nova tranquilinha (canta "O Barquinho" em "Passado e Presente"). É o passado cantando outros passados. Nos 80, limita-se ao auto-referencial, valendo-se de inúmeros duetos com contemporâneos da MPB para abrandar o cansaço estilístico de sua arte e a indigência de arranjos da década corrente. Nos 90, Nelson já vinha fenecendo. Visitou o minimalismo em "O Boêmio & o Pianista", dividido com Arthur Moreira Lima, mas acabou não fugindo do ridículo ao ofertar, como canto de cisne, CD de "rock nacional", com faixas de Herbert Vianna, Lulu Santos, Marina Lima e outros "jovens". A BMG ainda tem árduo trabalho pela frente se quiser reverenciar seu pioneiro, mas a amostragem já reunida é de respeito. Leia abaixo detalhes sobre cada um dos títulos lançados.
Coleção: Nelson Gonçalves (20 CDs) Lançamento: BMG Quanto: R$ 20, em média, cada CD


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