São Paulo, Terça-feira, 29 de Junho de 1999
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VIGO E LYDOU
Atriz põe acento "inglês" na voz de Lydou

Divulgação
A atriz francesa Romane Bohringer e James Frain, Lydon e Vigo no filme


especial para a Folha, em Londres

Quando Julien Temple decidiu que a francesa Romane Bohringer era a atriz que queria para interpretar Lydou Vigo, teve que assumir um risco razoável.
Em inglês, Romane sabia falar apenas uma -na verdade meia- frase: "Hello, my name is...". Mas a atriz prometeu que aprenderia a língua, e Temple acreditou. Os produtores da Film Four inglesa, preocupados, pressionaram o diretor, que, placidamente, mentiu: "Ela fala inglês."
Romane, que iniciou a carreira em cinema como a namorada obsessiva do protagonista soropositivo de "Noites Selvagens" (que lhe rendeu o César, o chamado Oscar francês, aos 17 anos), agora, aos 26, deveria viver novamente um papel secundário, como a mulher do cinebiografado Jean Vigo.
Temple, entretanto, preferiu fazer um drama conjugal a homenagear a carreira de um cineasta precoce e genial. Foi quando a atuação de Romane tornou-se capital para a história.

Acento com charme
Romane não decepciona e seu inglês, de fortíssimo acento francês, tem lá seu charme.
Filha de Richard Bohringer (que fez o papel do cozinheiro em "O Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o Amante", de Peter Greenaway), ela definitivamente não levava muita fé que Temple assumisse o risco. "No início, achei que seria outro teste que não me levaria a lugar algum. Muitos diretores ingleses e americanos vêm à França para escolher elenco, nos examinam às centenas, e depois escolhem uma atriz de seus países", disse.
Temple encantou-se com a afinidade entre atriz e personagem, o que deve tê-lo feito considerar a dificuldade linguística um problema contornável.
"Muito cedo, aos 17, eu me familiarizei com a intensidade. Na minha vida e nos meus personagens. Eu preciso da intensidade como alimento, porque sou muito tímida. Sou como um ratinho, preciso de uma enorme montanha diante de mim para me dar força", filosofa Romane.
Curiosamente, a Lydou de "Vigo" não foi o primeiro papel em que Romane precisou interpretar em inglês no cinema. Ela já havia participado de "Total Eclipse", ao lado de Leonardo DiCaprio, mas durante todo o filme ela não tinha mais do que 15 linhas de fala e isso não a ajudou muito com o idioma.

Teatro
A atriz iniciou sua carreira no teatro, já enfrentando o papel de Miranda, em "A Tempestade", de Shakespeare, numa montagem de elenco francês levada por Peter Brook.
"Minha performance no teste foi muito amadora. Acho que Brook me escolheu justamente porque eu era muita nova, sem conhecimento, sem técnica", diz. "Era exatamente como um nascimento, havia tudo por fazer."
Íntima do set de filmagem ("onde eu adorava dormir"), por acompanhar desde a infância seu pai no trabalho, teve a carreira catapultada na França quando foi premiada com o César por seu trabalho em "Noites Selvagens".
O drama pessoal do ator-diretor Cyril Collard -morto em consequência da Aids três dias antes da cerimônia de premiação- ajudou na difusão do nome da atriz, assim como o discurso emocionado que Romane fez ao receber a estatueta.
Ela costuma dizer que não gosta de fazer algo que já tenha aprendido. Diz tentar compor seus personagens "a partir do nada". Resta saber o que fará agora, depois de ter aprendido um novo idioma.
(PAULO VIEIRA)

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