São Paulo, sexta-feira, 29 de julho de 2005

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ERUDITO

Às vésperas de sua 11ª vinda ao país, maestro defende território palestino e fala da paixão pela música vienense

Mehta volta ao Brasil com orquestra de Israel

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Há quatro anos o maestro indiano Zubin Mehta, 69, não vinha a São Paulo com a Filarmônica de Israel, da qual é, desde 1981, diretor musical vitalício.
Pois eles estão chegando. Serão três concertos na Sala São Paulo, nos dias 7, 8 e 9 de agosto, o primeiro em benefício do Centro de Cultura Judaica (Beethoven, Maayani e Ravel), e os dois últimos na temporada da Sociedade de Cultura Artística (Mozart e Mahler).
Eis sua entrevista à Folha, por telefone, na última quarta-feira.

 

Folha - Esta será sua 11ª vinda a São Paulo, e em muitas delas tivemos concertos no Ibirapuera. O sr. lamenta não fazer agora o mesmo?
Zubin Mehta -
Lamento que nesta turnê uma nova apresentação no Ibirapuera não tenha sido programada. Alguns maestros resistem à idéia em razão da necessidade de amplificar o som. Mas é um mal necessário.

Folha - Sua discografia é imensa. O que gostaria ainda de gravar?
Mehta -
Eu gostaria de gravar uma versão integral do "Ring", de Richard Wagner [ciclo de quatro óperas de "O Anel do Nibelungo"]. Há dez ou 15 anos eu não me julgava preparado para isso. Agora, estou preparado. Mas nenhuma gravadora se dispõe a bancar o empreendimento.

Folha - Quanto a Wagner, o sr. foi o primeiro a interpretá-lo em Israel. A experiência não foi muito boa. Pretende recomeçá-la?
Mehta -
Creio não ter chegado o momento para tentar novamente. Wagner é ainda um assunto delicado para boa parte dos israelenses. Há ainda muitos judeus com números tatuados no braço [marca dos ex-internos em campos de concentração]. Mesmo que um israelense não tenha nada contra a Alemanha ao andar de Mercedes-Benz, com a música não é a mesma coisa, porque há a evocação do terror do Terceiro Reich.

Folha - Nos anos 60 o sr. era visto como um pacifista, opondo-se à Guerra do Vietnã. A paz é para o sr. ainda um conceito atual?
Mehta -
Eu falarei de paz e cultuarei a paz em todos os momentos que puder.

Folha - Como vê o diálogo pela paz no Oriente Médio?
Mehta -
Estamos em um momento favorável ao diálogo e à espera do que ocorrerá depois da retirada israelense de Gaza. Como muitos outros, eu gostaria de ver o surgimento de um Estado Palestino. E gostaria que o governo israelense fixasse um prazo para que isso acontecesse. Mas eu sou apenas um músico.

Folha - Se a paz na região se solidificasse, o sr. poderia até reger em Damasco, na Síria.
Mehta -
Eu adoraria levar a Filarmônica de Israel a se apresentar em Damasco. E também em Beirute ou em outras capitais do mundo árabe. É um sonho meu.

Folha - Em dois de seus concertos o sr. programou uma sinfonia de Mozart e outra de Mahler. É a busca de um contraste entre duas linguagens sinfônicas diferentes?
Mehta -
Não há diferenças. São duas imensas sonatas. Elas têm também a mesma construção. O primeiro movimento da "Sinfonia n.º 6" de Mahler é uma sonata, tanto quanto o primeiro movimento da "Sinfonia n.º 41" de Mozart. São produtos de Viena.

Folha - Por que o sr. se sente tão bem ao reger Mahler?
Mehta -
Em verdade eu me sinto muitíssimo bem ao reger qualquer música vienense, de Joseph Haydn a Alban Berg.

Folha - Por que o sr. não tem gravado mais compositores contemporâneos, como o fez com Penderecki ou Luciano Berio?
Mehta -
Quando gravadoras entraram em dificuldades econômicas, o repertório contemporâneo deixou de ser gravado.

Folha - Novas tecnologias permitem fazer o download de composições em websites. Há uma nova percepção a caminho do repertório erudito?
Mehta -
Isso não é relevante. O importante é que as salas de concerto continuam cheias. Aqui em Israel estamos com cinco récitas programadas para a "Sinfonia n.º 9" de Beethoven. Os ingressos já foram todos vendidos. As pessoas precisam de música.

Folha - Uma última pergunta: caso o sr. não fosse Zubin Mehta, que outro maestro gostaria de ter sido?
Mehta -
Eu gostaria de ter sido Erich Kleiber [(1890-1956), maestro vienense que emigrou com o nazismo e se naturalizou argentino]. Sou grande admirador dele.
Filarmônica de Israel Regência: Zubin Mehta
Quando: 7/8, às 20h; 8/8 e 9/8, às 21h
Onde: Sala São Paulo (pça. Júlio Prestes s/n, tel. 0/xx/11/3337-5414)
Ingressos: para o dia 7, apenas pela Fun by Net (tel. 0/xx/11/5087-3450); para os dias 8 e 9, também no Cultura Artística (r. Nestor Pestana, 196, tel. 0/xx/11/3258-3344)
Quanto: R$ 150 a R$ 500, ou R$ 10 para estudantes com menos de 30 anos, meia hora antes dos concertos dos dias 8 e 9


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