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PSICANÁLISE
Maior parte dos seguidores de correntes alternativas à freudiana se filiam ao método do francês dissidente
Teses de Lacan se adaptam aos trópicos
DA REPORTAGEM LOCAL
Fora da International Psychoanalythical Association (IPA), a
instituição original criada por
Freud, há uma multidão de psicanalistas de diferentes correntes. A
maioria deles influenciados pelo
pensamento de Jacques Lacan,
embora existam os chamados
"independentes" (que não fazem
parte da IPA nem são lacanianos
"duros"). A presença do Brasil
nessa esfera também cresceu
muito nos últimos anos.
Todo o multifacetado universo
exterior à IPA e à ortodoxia lacaniana reuniu-se em julho passado
em Paris, em um encontro denominado Estados Gerais da Psicanálise. Além da convocação dos
Estados Gerais ter sido inspirada
por uma psicanalista brasileira,
Helena Besserman Viana, do Rio
de Janeiro, o número de trabalhos
apresentados por profissionais do
Brasil esteve entre os mais altos do
mundo.
O psicanalista francês Jacques
Lacan rompeu com a IPA na década de 50. Polêmico como analista, porém unanimemente reconhecido como intelectual brilhante, ele criou uma nova escola psicanalítica.
Os numerosíssimos filhos espirituais de Lacan, espalhados pelo
planeta, terminaram por se reunir
em outra organização internacional, com sede em Paris, a Association Psycanalytique Mondiale
(APM).
Com a morte de Lacan, em 1981,
a APM passou a ser comandada
pelo contestado genro do mestre,
Jacques Alain-Miller, o que gerou
inúmeras divisões, com a formação de novas organizações. No
Brasil, a Escola Brasileira de Psicanálise, dirigida pelo psicanalista
de São Paulo Jorge Forbes, filia-se
à APM. Mas há dezenas de instituições lacanianas no Brasil que
não respondem à APM.
No Brasil, assim como na Argentina, o lacanismo difundiu-se
muito. Pulverizados, é difícil saber quantos psicanalistas lacanianos existem no país, mas superam
em larga escala os da IPA. De modo geral, a formação de um psicanalista lacaniano não obedece à
demoradíssima liturgia da IPA.
A inventividade lacaniana deu-se bem nos trópicos. Para uma
das precursoras dessa escola no
Brasil, a psicanalista e escritora
Betty Milan, o Brasil é "muito favorável para a psicanálise, porque
nele vigora a cultura do brincar".
Betty, que mora entre Paris e
São Paulo, fez análise com o próprio Lacan. A experiência está relatada no romance "O Papagaio e
o Doutor". Depois, ela trabalhou
por muitos anos com o carnavalesco Joãosinho Trinta. Em 1985,
promoveu, junto com Magno
Machado Dias, o Congresso da
Banana no Copacabana Palace do
Rio de Janeiro. "No encerramento, a Beija-Flor entrou no Copa",
lembra Betty. "Foi maravilhoso."
"Na psicanálise você só faz alguma descoberta se tiver uma atitude de gratuidade em relação às
palavras", afirma ela. "Ao brincar,
o carnavalesco traz junto uma sublimação." Por isso, está convencida de que o Brasil é o país da psicanálise. "No dia em que o Brasil
aprender a diferençar brincadeira
de sacanagem, o Brasil vai ser nota 10."
Forbes, representante de Alain-Miller no Brasil, pensa em direções parecidas às de Milan. "O
Brasil é um país perceptivo o suficiente para não se levar a sério",
diz ele. "E a psicanálise se dá mal
em países que tentam fazer uma
ortopedia do desejo."
Forbes não acha casual que tenha sido um engenheiro e físico
brasileiro, o professor de filosofia
Newton da Costa, da Universidade de São Paulo (USP), o inventor
da lógica paraconsistente, "a única formalização existente da lógica que Freud descobriu no inconsciente", acrescenta Forbes.
"O inconsciente não se estrutura
segundo o princípio da não-contradição", acrescenta Betty Milan.
Autor do livro "Da Palavra ao
Gesto do Analista", Forbes se prepara para fazer em outubro uma
conferência em Paris sobre a relação entre a psicanálise e a música
de Tom Jobim. "O Brasil é hoje o
grande laboratório da psicanálise", conclui, entusiasmado.
(AS)
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