São Paulo, sexta-feira, 29 de setembro de 2000

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TEATRO
Diretor mineiro rompe "cânones" da Broadway na montagem da peça de Chico Buarque que estréia hoje no TBC
Villela quer antimusical em "Ópera do Malandro"


VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Gabriel Villela e equipe querem errar com causa no musical "A Ópera do Malandro". "Não aceito o certo, quero o errado", diz o diretor.
Villela, 41, define o seu novo projeto como uma "provocação estética" ao musical norte-americano, um "desbunde" no cânone da Broadway, a "fôrma" da qual não escapam as produções que aportaram em São Paulo recentemente -caso de "Rent".
"Não se trata de uma oposição à vinda de musicais da Broadway, mas seria desagradável montar "Jesus Christ Superstar" no TBC, o nosso epicentro histórico." No limite, a montagem do musical do compositor Chico Buarque se pretende "antimusical".
A interpretação "suja", o canto "desafinado", o improviso, o uso imoderado dos recursos de cenografia, figurino e iluminação -que, na concepção barroca do encenador mineiro, não constitui novidade-, enfim, tudo converge para um "teatro do equívoco", na definição de Villela.
"É um salvo-conduto para o elenco. A Globo dita o padrão de interpretação hoje no país, então, por favor, que errem a Globo."
O objetivo, diz, é destruir para construir. Quer preencher o hiato que separa as novas gerações de autores como Arthur Azevedo (da burleta "O Mambembe", já encenada pelo próprio Villela), da irreverência de uma Dercy Gonçalves e de projetos como o do grupo Arena nos anos 60 ("Conta Zumbi", "Conta Tiradentes").
Esse teatro do equívoco, definição que não tem fundamento teórico e surgiu à guisa dos quatro meses de ensaios, é também uma maneira de "gerar uma dialética brechtiana".
"A Ópera do Malandro" é baseada na "Ópera dos Três Vinténs" (1928), de Bertolt Brecht e Kurt Weill, dupla que, por sua vez, foi inspirada pela "Ópera dos Mendigos" (1728), de John Gay. Em comum, expõem a máfia, a bandidagem, o conluio que monitora explorados e exploradores.
Na primeira criação musical que assinaria sozinho, depois de "Calabar" (1973, parceria com Ruy Guerra) e "Gota D"Água" (1975, com Paulo Pontes), Chico Buarque transpõe a história para o subúrbio carioca da Lapa, nos anos 40 (leia texto ao lado).
Villela assistiu à primeira montagem de "A Ópera do Malandro" há 22 anos, dirigida por Luiz Antonio Martinez Corrêa, irmão de Zé Celso.
Segundo o encenador, Martinez Corrêa já acenava com um jeito brasileiro de fazer teatro musical. "Para onde vai a prosódia brasileira com o advento dos microfones?", pergunta o diretor. Ele desdenha do "aparelho" que "virou moda" e diz que os atores têm de cantar "no gogó".
A direção musical é da preparadora vocal Babaya, do grupo Ponto de Partida (Barbacena, MG), também responsável pela Escola do Canto, em Belo Horizonte.
Babaya vem de parcerias com Villela desde 92 ("Romeu e Julieta", "A Rua da Amargura"), além de trabalharem em shows de Milton Nascimento e Maria Bethânia.
"Os atores cantam lindamente, mas o desafio é justamente desafinar, variando os timbres do operístico ao popular, ora mascando chiclete, mas conscientes do que queremos comunicar no campo das idéias", afirma Babaya, 49.
O cenógrafo J.C. Serroni e equipe superpõem três planos de ação em um espaço que lembra um "saloon", com suas estruturas em madeirite. Há caixotes, garrafas de uísque falsificado e um amontoado de objetos que lembram um almoxarifado.
"É o caos em sua absoluta coesão", como quer Villela.


Peça: Ópera do Malandro Autor: Chico Buarque Direção: Gabriel Villela Com: Companhia Estável de Repertório Quando: estréia hoje, às 21h; qui. a sáb., às 21h; dom., às 20h. Até 17/12 Onde: Teatro Brasileiro de Comédia -sala TBC (r. Major Diogo, 315, Bela Vista, SP, tel. 0/xx/11/3115-4622) Quanto: R$ 10 a R$ 25 Patrocinador: Schahin

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