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NOVA BAIANA
Compositor selecionou repertório do disco, dirige show e vê na cantora "contraponto a comercialismo"
"Virginia é ponto de luz", diz Caetano
do enviado especial
Trabalhando como padrinho informal de Virginia Rodrigues,
Caetano Veloso tem sido, desde
que a conheceu, um dos grandes
entusiastas de seu lançamento.
Editado pela gravadora Natasha
-de que sua mulher, Paula Lavigne, é sócia-, o disco tem direção
artística de Caetano.
Parte do repertório foi selecionada por ele, e Caetano dirige também o show de apresentação da
cantora, em cartaz nesta semana
em Salvador.
Na véspera da estréia do show,
na terça-feira, Caetano falou à Folha sobre Virginia. Leia trechos de
sua entrevista, em que ele também
ataca a imprensa por ela não ter
dado atenção ao último disco de
Simone e por ter considerado
"Bebadosamba", de Paulinho da
Viola, como um dos melhores CDs
da década.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Folha - Quem é Virginia Rodrigues para Caetano Veloso?
Caetano Veloso - É para mim
uma grande surpresa, uma aparição surpreendente de beleza pura
do seio da cultura do povo do recôncavo da Bahia.
Eu ouvi Virginia cantando pela
primeira vez no ensaio do Bando
de Teatro do Olodum. Fiquei emocionadíssimo. O Márcio Meirelles,
diretor do grupo, quis gravar seu
disco, mas não conseguiu.
O projeto ficou sem encaminhamento, e, através da Paulinha (Lavigne), os outros donos da Natasha tomaram contato com o material e disseram que tinham interesse em fazer.
Estando próximo e tendo ficado
apaixonado pelo que ouvi, participei da elaboração do repertório e
da concepção do disco. Aí eu quis
dirigir o show.
Folha - O que você, como ouvinte, acha do disco?
Caetano - Acho que ficou lindo.
É um ponto de luz pura num ângulo muito especial da verdade geral
da produção de música no Brasil e
da cultura popular brasileira.
É uma coisa que deve ser tratada
com muito cuidado, porque é, entre outras coisas, frágil. Mas é muito ligado ao precioso e ao sublime.
É maravilhoso que justamente na
Bahia hoje surja alguém que traga
esses elementos à frente da cena.
O panorama atual implica num
agressivo comercialismo de que
Virginia faz um contraponto muito nítido e natural. A luz nova que
ela traz vai ser curativa para o que
há de hipertrofiado no comercialismo e na vulgarização. É um ponto de resistência à vulgaridade.
Folha - Ela é assim naturalmente
ou há um trabalho de produção?
Caetano - O repertório foi escolhido majoritariamente pela própria Virginia e totalmente em comum acordo com ela. Se tudo tivesse sido deixado nas mãos dela,
o disco que ela chegaria a fazer estaria muito mais próximo desse
que de um disco de axé music.
Folha - Essa mulher apareceria se
não houvesse sua interferência?
Caetano - Quando a vi, ela já
estava em certa medida aparecida.
Era ovacionada quando cantava
na peça "Bye-Bye, Pelô".
Folha - Estando o nome dela ligado ao seu, até que ponto as pessoas estarão a apreciando de fato
ou seguindo uma referência sua?
Caetano - Eu não me preocupo
com isso. É um falso problema. O
público não se orienta por isso.
Não se transfere voto.
Folha - Mas há muito de Caetano
no disco, não?
Caetano - Há canções minhas,
porque ela fez questão. Ela não
abriu mão, eu respeitei.
Folha - Virginia é um novo passo
na linha evolutiva da MPB?
Caetano - Eu não penso em
Virginia em termos de linha evolutiva, mas acho que a aparição de
uma figura tão especial num momento tão definido num tom diferente do dela contribui para que a
evolução possível se dê de maneira
saudável.
Folha - Que outros novos talentos você vê na MPB dos 90?
Caetano - Arnaldo Antunes é o
exemplo de um artista que admiro
enormemente, os discos que ele
fez sozinho são lindos. Fiquei encantado com a qualidade do show
de Zélia Duncan, com a afinação,
como ela toca. É incrível.
Ninguém na imprensa disse que
o disco da Simone com músicas do
Martinho da Vila é um acontecimento de grande importância. É
um escândalo que ninguém veja.
É muito fácil dizer, como a imprensa disse, que não pode existir
um disco tão bom quanto o do
Paulinho da Viola nesta década.
Isso é uma coisa apenas escandalosa. É o mesmo que dizer que o presidente da República está comprando voto para se reeleger. As
duas coisas não significam nada e
são horrorosas. Não são verdade.
Folha - Nenhuma das duas coisas
é verdade?
Caetano - Não. Não são verdades no sentido que foram postas.
Não são verdades diretas, são interpretações de verdades difusas
feitas de má fé.
Folha - Por que de má fé?
Caetano - O disco do Paulinho
é excelente, maravilhoso, mas
nem sequer está entre os melhores
discos dele. Está entre os bons, não
é o melhor disco da década. Aquilo
tem valor jornalístico, no mau
sentido da palavra.
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