São Paulo, Quarta-feira, 30 de Junho de 1999
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CINEMA
"Algo em Comum" tem pré-estréia hoje em SP; filme reúne as mazelas do Holocausto às dos meninos de rua
Curta mescla barbáries do passado e presente

CLÁUDIA GURFINKEL
free-lance para a Folha

Um filme que trata da questão das minorias, das barbáries e holocaustos que a humanidade já viveu e que ainda vive.
Assim é "Algo em Comum", um curta-metragem de Reinaldo Pinheiro e Edu Ramos, que tem sua pré-estréia hoje, às 20h30, no Museu da Imagem e do Som (MIS), em São Paulo.
O curta mostra um menino negro correndo pelas ruas da metrópole e um coral de velhos judeus ensaiando músicas do Holocausto.
O coral Tradição, que comemora uma década em 1999, canta "Dos Kebl" ("O Bezerro"), em iídiche (língua com base no alemão do século 14, acrescido de elementos hebraicos e eslavos).
"No início, nós queríamos fazer um documentário sobre o Bom Retiro, que foi um bairro tradicional judaico até o final da década de 80. Mostraríamos a chegada dos coreanos e a saída dos judeus, a descaracterização do bairro", diz Pinheiro.
"Mas, para não ficar um documentário careta, tivemos a idéia de falar sobre o Holocausto, as minorias, os excluídos."

Seleção
O Bom Retiro acabou virando o cenário da história de "Algo em Comum".
O protagonista, Mário Sérgio dos Santos Oliveira, 10, foi selecionado entre 120 crianças. Ele foge pelas ruas do bairro e acaba se inserindo no ensaio do coral.
Para unir esses dois elementos -os judeus e os meninos abandonados-, o curta mostra imagens fortes da questão do menor de rua no Brasil e do Holocausto, vivido pelos judeus durante a Segunda Guerra Mundial.
"Tentamos pegar as imagens menos clichês possíveis, já que não queríamos mostrar corpos amontoados. Mas são imagens bastante tocantes", diz Ramos.

Pacifismo
E a dupla só se utiliza de imagens para registrar a barbárie e o encontro, mostrando assim que os judeus do coral do Instituto Cultural Israelita Brasileiro (Icib) e o menino têm algo em comum.
"Em certos momentos, a palavra não tem significado", afirma Ramos. "É por meio da troca de olhar do menino com a maestrina do coral, Hugueta Sendacz, que conseguimos passar uma visão pacifista do assunto."

Festivais
O filme, o segundo da dupla, foi gravado em novembro de 1998 e começou a ser editado em março.
O primeiro curta de Pinheiro e Ramos foi "A Desforra da Titia" (1995), inspirado nos quadrinhos pornográficos de Carlos Zéfiro, famosos nos anos 60; o filme deu a Cristina Mullins o prêmio de melhor atriz no Festival de Gramado daquele ano.
"Aqui no Brasil, nós pretendemos levar "Algo em Comum" para vários festivais, como os de Gramado, Brasília, Rio de Janeiro, Recife e Ceará", diz Pinheiro. "Mas nós estamos pensando muito no mercado externo. Achamos que a compreensão na Europa vai ser muito grande."

CD
Além do filme, o coral Tradição, com seus 35 componentes, lançou um álbum para comemorar seus dez anos. "Canta Tradição", à venda desde o início do mês de junho, tem 18 faixas, todas em iídiche.
As imagens do coral foram feitas em um dia; já as do menino Mário Sérgio foram feitas em três.
O curta-metragem, de dez minutos, termina com o menino cantando, em português, a mesma música do coral. A letra contrasta, usando as imagens do bezerro e de pássaros, o genocídio nazista e a liberdade.


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