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DAVID CRONENBERG
`Os homens nunca aceitaram o mundo'
WAGNER ARAÚJO
free-lance para a Folha
em Londres
A estranheza de ``Crash'', o novo
filme do diretor canadense David
Cronenberg, 53, não pode ser explicada por palavras. ``As mais estranhas e complexas reações foi o
que me atraiu no livro", diz Cronenberg. Leia abaixo entrevista
com o diretor.
Folha - Como você lê o livro?
David Cronenberg - J.G. Ballard antecipa a psicologia do próximo século no livro, escrito em
1973. Ele vê a estranha forma como
as pessoas respondem as outras, o
que aconteceu com o erotismo, o
amor e suas interconexões.
``Crash'' e uma extrapolação do
futuro, das coisas que acontecem
na sociedade ocidental.
Folha - Conte um pouco a respeito do processo de roteirização.
Cronenberg - O trabalho foi relativamente fácil. Eu pensei que seria complexo como o foi em "Naked Lunch", quando tive que
reinventar totalmente o livro sem
me afastar do tema da narrativa. O
livro de Ballard é muito cinematográfico porque é muito exterior.
``Crash'' está próximo de ``Gêmeos-Mórbida Semelhança''.
Folha - Como você vê o filme?
Cronenberg - Esse não é um filme para pessoas que querem ver
sexo e carros, embora tenha muito
de ambos.
Não é tão simples assim. Carros
são a tecnologia pela qual os personagens estão reinventando a
existência humana.
Ballard acredita que os humanos
não se adaptaram ao ambiente humano. Os homens nunca aceitaram o mundo como ele é, e nós o
temos reinventado, mas nosso
comportamento é parecido com o
dos homens das cavernas.
Folha - ``Crash'' é obsceno?
Cronenberg - Eu tentei sugerir
grande sutileza na interação entre
os personagens, e penso que isso é
o que salva o filme da obscenidade.
Com toda a pressão dos politicamente corretos é quase impossível
tratar sexualidade inteligentemente.
As pessoas são frequentemente
tocadas pelo erotismo no filme
porque eles pensam que sexualidade não é saudável. Não há nada
pornográfico no meu filme.
O que eu tentei mostrar foi a participação dos personagens em
uma fantasia sexual, e não um semi-documentário do encontro sexual entre mamíferos.
Folha - O carro ganha outra dimensão nesse filme?
Cronenberg - Os carros são
usados muito fisicamente, sexualmente, no filme, como uma utilidade muito além da juvenil de pegar a namorada e ir fazer amor
num local afastado, mas para fazer
amor com ela quando ela está em
um outro carro, para ter um orgasmo enquanto estiver colidindo
com o carro. Essa é a essência de
``Crash''.
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