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"Sou Roberto Carlos"
Bel Pedrosa/Folha Imagem
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Paulo Ricardo, cuja música "Dois" é primeiro lugar nas rádios, diz querer ocupar espaço de Enrique Iglesias
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Paulo Ricardo volta às paradas
com "Dois", parceria com
Michael Sullivan que o leva a
fazer shows em Rondônia e na
periferia de São Paulo, e diz
querer espaço de Enrique Iglesias
e Laura Pausini
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PAULO VIEIRA
enviado especial ao Rio
"Eu sei que eu/ eu queria estar
contigo/ mas sei/ que não/ sei que
não é permitido/ talvez/ se nós/ se
nós tivéssemos fugido/ e ouvido a
voz/ desse desconhecido/ o amor/
o amor/ o amor/ o amor."
Dado da Radiolink, instituto que
mede execução de músicas nas
emissoras de rádio brasileiras:
"Dois", de Paulo Ricardo e Michael Sullivan, cujo refrão foi declinado acima, é primeiríssimo lugar nas emissoras de rádio de São
Paulo, superando "Um Sonhador" (Leandro & Leonardo), "As
Long as You Love Me" (Backstreet
Boys) e "A Dança do ET" (ET e
Rodolfo).
Paulo Ricardo concorda com o
termo "ressurreição", usado por
algumas publicações para definir
sua volta ao topo das paradas.
Desde o apogeu do RPM (85/86),
quando vendeu 3 milhões de cópias, o cantor amarga insucessos
de vendagem e execução de sucessivos discos solo e de uma tentativa de retornar com o RPM.
Ele já se preparava para contabilizar mais um fiasco, mas eis que
"Dois" foi escolhida para acompanhar os passos de Billy, personagem de Fábio Jr. na novela
"Corpo Dourado" (Globo, 19h).
A faixa puxou "O Amor me Escolheu" ao patamar das 250 mil
cópias vendidas.
O cantor agora faz shows em
Rondônia -três na semana que
vem- e, em São Paulo, é mais
bem recebido em casas populares
como o Brasileirão e Fundão da
Barra -faz shows em ambas amanhã-, que no Tom Brasil.
Dizendo querer ocupar um lugar
no mercado fonográfico nacional
tomado por estrangeiros como
Eros Ramazotti e Enrique Iglesias,
reclamando do termo brega
("brega não é gravar 'Raul Gil', é
assisti-lo") que lhe foi pespegado,
Paulo Ricardo recebeu a Folha
num restaurante do Leblon para
esta entrevista.
Folha - Por que você trocou o
rock pelo repertório romântico?
Paulo Ricardo - Eu insisti muito
com o rock. Ficou muito claro no
meu último disco o que as pessoas
esperavam de mim, e não era hard
rock. Legal o rock'n'roll, uau, mas
eu queria mais, sou um cara de
formação pop, não sou Made in
Brazil.
Então fui me despindo da pele do
rock e decidi privilegiar as baladas,
tirar o preconceito de cima do romântico. Tirar sua ligação com o
sertanejo, com o pagode, o brega.
Folha - Foi difícil livrar-se do
rock?
Paulo Ricardo - Eu sofri. Durante muito tempo na minha vida,
o rock foi a minha ideologia, foi
fundamental até para o meu encaixe social. Jamais vou dar as costas
ao rock. Ele foi meu primeiro e segundo graus.
Agora, quando se entra no território de MPB, aí é coisa de adulto,
não tem mais essas referências
"bubble gum" do rock. É coisa
séria, profissional. Música brasileira é Tom Jobim, Vinicius de
Moraes, não é troço baseado em
trejeitos, tiques.
Folha - O que você foi ouvir para
tentar cantar "romântico"?
Paulo Ricardo - Francisco Alves, Ataulfo Alves, Lupicinio. Não
exatamente para ter uma influência direta, mas para entrar nesse
ambiente. Queria saber o que falavam, e de que maneira. Não teria
escrito as letras se não os tivesse
ouvido.
Chico e Caetano são uma influência tremenda, mas nem sempre dá para saber o que eles querem dizer.
Folha - E quanto aos contemporâneos, Fábio Jr., Zé Augusto?
Paulo Ricardo -O Fábio, o Fábio
você ouve muito no rádio. Sempre
disseram que eu seria seu sucessor.
Mas ele é um cara de TV, acho que
tenho mais afinidade com o Roberto Carlos, que, como eu, veio
do rock. Ouvi sertanejos, o Leonardo é um puta cantor. O Zé (Augusto) ouvi também. E também os
gringos, Luis Miguel, Ricky Martin, esses caras que vêm aqui e ocupam nosso espaço. Não posso admitir que o Enrique Iglesias faça
mais sucesso do que os artistas
brasileiros só por termos pudores
de lidar com repertório romântico. Tenho afinidade com esse universo, mas sinto um tremendo
preconceito contra alguém que
quer fazer algo popular. Trabalhei
com Michael Sullivan e não posso
te dizer que não houve uma época
em que eu pensava: "Porra, Michael Sullivan!". Quero quebrar isso, isso prejudica o Brasil.
Folha - Depois de demorar tanto
a engatar, você ainda acreditava
no sucesso do disco?
Paulo Ricardo - Eu já tinha o
disco seguinte pronto na minha
cabeça. Depois da ascensão rápida
do RPM, sabia que isso não iria se
repetir, que qualquer outro êxito
na minha carreira teria que ser disputado milímetro por milímetro.
Além do mais, eu era um cara
com um desgaste tremendo, totalmente queimado. Diziam: "Paulo
Ricardo não, pelo amor de Deus".
Folha - E agora, com o sucesso de
volta, você se considera vingado
de seus detratores?
Paulo Ricardo - Depois de um
ano com o disco lançado, trabalhando para cacete, não é agora
que eu vou dizer "yeah". Eu me
sinto agora meio zen, sereno. Estava cansado de picos, sucesso, fracasso. Mas não vou ficar alardeando minha vitória. A música romântica não tem esse ferrão. O objetivo desse disco não se resume a
ele, é o objetivo de uma vida.
Folha - Mas dá para falar ao menos em vitória pessoal?
Paulo Ricardo - Não. Ser campeão de execução, com dez inserções a mais que o segundo colocado, é comprovar uma percepção
de que havia uma demanda reprimida. Senti isso também com o
RPM. Como explicar um sucesso
tão estrondoso? "Demorou", como diria o carioca. Demorou para
vir uma banda de pop rock brasileiro, e todo mundo queria aquilo.
O brasileiro é aberto à novidade.
Folha - Sua fase romântica é
mais, digamos, verdadeira que a
roqueira?
Paulo Ricardo - Você pode até
fazer rock'n'roll de mentira, mas
não pode cantar música romântica
de mentira. É interpretação, emoção, não são valores de revista, é
troço que bate ou não bate. É para
ouvir no rádio. E tem o seguinte:
comecei a querer fazer música por
causa do Roberto Carlos. Não pela
bossa nova ou pelo Arrigo Barnabé. Com o RPM, uma banda em
que eu estava quando tinha 20
anos, eu queria dizer exatamente
aquelas coisas de revolução etc.
Hoje em dia, estou mais velho, não
tem mais essa de colocar o bagulhinho da última tendência para ficar "up to date" com os chapinhas da imprensa. Não tenho mais
nada a ver com isso. Faço música
de maneira mais emocional, desenho da melodia explodindo no refrão. Sob o manto do rock, você
joga muita porcaria, mas com a
música romântica não tem meia
boca.
Folha - Você estava realmente
disposto a enfrentar as consequências da adoção desse repertório, as críticas, os programas de TV
populares...
Paulo Ricardo - O RPM, por
exemplo, nunca deixou de fazer
TV, esse era mesmo um diferencial
nosso de bandas como o Ira!, Legião, Capital. Eu sempre quis ser
popular. Foi lindo ser capa do fanzine do Madame Satã, mas eu queria ser capa da "Manchete".
Nunca quis ser o Fugazzi, quero
ser os Beatles. Então eu sempre fui
"mainstream", sou Roberto Carlos em ritmo de aventura.
Folha - O que aconteceria com
você, se o disco, como dava a entender, não tivesse o empurrão da
novela e fracassasse?
Paulo Ricardo - Eu provavelmente iria insistir no disco seguinte, talvez enxugando elementos.
Tiraria as firulas que criaram os
ruídos na comunicação direta, no
potencial de emocionar.
Nunca quis que "Dois" batesse
como coisa bizarra, como um híbrido de rock com romântico.
Bryan Adams é rock romântico,
está cheio de rock romântico por
aí. Por que tem de vir um Eros Ramazotti, uma Laura Pausini ocupar esse espaço? Nossas bandas
devem se limitar a fazer música para skatista?
O grande triunfo dessa minha
música é o da forma. De fazer uma
música popular brasileira romântica contemporânea. O sucesso diz
que existe vontade de se ouvir romantismo com sonzão. Eu estou
nos shows com um pacote de banda de rock, não com orquestra ou
cantoras de backing vocal.
Folha - É sabido que o RPM ganhou muito dinheiro, mas vocês
foram péssimos administradores.
Diz-se que os quatro "cheiraram"
a grana. Qual a verdade disso?
Paulo Ricardo - Nunca gastei
dinheiro com drogas, porque,
quando você está por cima, todo
mundo quer te "apresentar". Gastava uma mixaria. E era o mais
light da banda. O "Jornal da Tarde" "matou" o PA numa matéria,
e o cara está vivo, trabalhando. Tudo bem, era quem mais pegava pesado na cocaína, mas ele também
não gastava dinheiro, morava com
a mãe, não tinha filho.
O que mais queimou nosso dinheiro foi a gravadora que montamos, a RPM Discos. Fechávamos
um estúdio por horas e horas só
para remixar um negocinho. E
ainda bem que não tocamos o segundo projeto da casa, um disco
da Elza Soares produzido pelo
Branco Mello. Mas vivíamos também muito bem. Comprei dúplex à
vista, tinha uma cabine dupla, moto, viajei o mundo todo.
A maior parte da grana foi embora mesmo nessa maldita gravadora. Deus me livre. A gente queria
fazer a Apple, só que a Apple não
deu certo com os Beatles, como é
que ia dar certo com a gente?
Você ainda alisa o cabelo?
Paulo Ricardo - Nunca alisei o
cabelo, eu uso gel, se não usar, ele
fica mais enrolado. Alisei uma vez
quando tinha 16 anos, o cabeleireiro propôs, mas fiquei parecendo
um japonês. Nunca mais.
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