|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Casa de Anais Nin' vence o kitsch com humor
da Reportagem Local
O primeiro impacto de "Casa de
Anais Nin", peça do brasileiro
Chico Azevedo inspirada na relação entre os escritores Ana$s Nin e
Henry Miller, é de repulsa. O figurino é de uma afetação de elegância erótica, mas que se mantém
mesmo é nos limites de um kitsch
constrangido.
Os atores começam a falar e
saem não diálogos, mas narrativas. Descrevem-se contos, no ritmo de quem está, como vai a situação da peça, escrevendo em
prosa. Ana$s Nin fala e não é para
si mesma, menos ainda para o público, ali diante dela: ela está lendo, seu tom é de leitura.
A situação: Ana$s Nin, Henry
Miller e um terceiro e fictício autor, Gonçalo, escrevem sem parar
contos pornográficos para um velho milionário, que paga muito
bem por eles.
Os contos comandam o espetáculo, bem mais do que os conflitos
superficiais dos três escritores sobre a literatura por encomenda e
coisas assim. Os contos são representados por outros atores -e a
repulsa do espectador aumenta. O
erotismo é empostado, supostamente poético, mas, na realidade,
formal, inibido.
Atrizes e atores cheios de roupa
(não há nudez nesta "Casa de
Ana$s Nin" estranhamente recatada) se agarram, fazem caras e bocas pelos cantos do palco.
Vai um bom tempo assim o espetáculo. Por exemplo, com a cena
de um "hermafrodita, ao mesmo
tempo homem e mulher", que se
lamenta dizendo que, ao nascer,
"pensaram que eu era um monstro" -enquanto duas mulheres,
em lingerie preta, fazem poses supostamente sensuais.
É pavoroso, até que entra outro
conto e uma atriz, Miwa Yanagizawa, explica ao espectador que não
é bem assim.
Ela faz, com inesperado e envolvente humor, uma mulher sendo
bolinada -até o orgasmo- num
vagão lotado de metrô. "Casa de
Ana$s Nin", entende-se afinal, é
uma comédia.
A sensualidade vestida dos atores, seu sexo simulado, sua excitação de araque não tinham mesmo
como não ser comédia. Então
crescem todos, de Walney Costa
(um Henry Miller afinal sarcástico
e vigoroso, "manly") aos intérpretes dos contos -e até Lucélia
Santos, em que pese seu bom-mocismo sempre presente.
Os atores todos adquirem uma
ironia no falar e no olhar de que
antes não se tinha sinal. E os contos encenados ganham caráter de
quadros de farsa. É quando o velho milionário exclama, ao receber e "ler" um novo conto encomendado: "Agora está muito melhor". E estava, de fato.
O espetáculo passa a funcionar e,
até o final, o que antes era constrangedor passa a fazer sentido.
Até o sexo simulado, com cenas
mais chocantes, inclusive de homossexualismo, torna-se verdadeiro -e ganha, sobretudo, a
poesia de que Lucélia Santos/Ana$s Nin falava no início, quando
o que menos se via era poesia.
Ainda assim, não é um grande
texto de teatro, com toda a sua
prosa de leitura, nem uma encenação especialmente criativa. Cenário e figurinos, não tem jeito, são
de doer. Mas se entende, encerrada a apresentação, por que "Casa
de Ana$s Nin" permaneceu (com
outro elenco, segundo se informa)
longos nove meses em cartaz, no
Rio de Janeiro.
(NS)
Peça: Casa de Ana$s Nin
Direção: Ticiana Studart
Quando: sex. e sáb., às 21h; dom., às 18h
Onde: Teatro Hilton (av. Ipiranga, 165, tel.
011/259-6508)
Quanto: R$ 15 (sex.), R$ 25 e R$ 30 (sáb.)
Patrocinador: Embratel
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|