São Paulo, segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Edição de luxo revê Carnavais

Imagens, documentos e depoimentos resgatam história do gênero em "Frevo -100 Anos de Folia'

Livro reproduz opiniões de autores brasileiros e descreve disputa judicial que garantiu aos irmãos Valença crédito por "O Teu Cabelo Não Nega"

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Assim como o disco "Frevo do Mundo", o livro "Frevo - 100 Anos de Folia" vem a público no apagar das luzes do centenário do ritmo, festejado em 9 de fevereiro de 2007, tomando como marco a primeira menção à palavra na imprensa. Foi lançado dia 20 de dezembro, em São Paulo, e o será no Recife em 9/1.
Trata-se de uma edição de luxo, com capa dura e papel couchê, que compila imagens e textos produzidos ao longo de vários Carnavais. É ancorada em ensaios dos fotógrafos Pierre Verger (em 1947) e Marcel Gautherot (1957), somados a imagens de arquivos públicos e acervos particulares, além de reproduções de obras inspiradas no frevo, de artistas como Portinari, Lula Cardoso Ayres e Vicente do Rego Monteiro.
Embora seja o típico livro de mesinha de centro, mais para ver do que para ler, há depoimentos de estudiosos e de autores influenciados pelo frevo e pelo Carnaval pernambucanos (Clarice Lispector, Mário de Andrade, Caetano Veloso etc; leia alguns ao lado), e, mais importante, a pesquisa de Camilo Cassoli, Luiz Augusto Falcão e Rodrigo Aguiar revolve documentos significativos.
É o caso da autoria de "O Teu Cabelo Não Nega". Composta como frevo pelos irmãos pernambucanos Raul e João Valença e modificada em parte por Lamartine Babo, foi lançada pela RCA Victor em 1932 só com o crédito genérico "Motivos do Norte, adaptação de Lamartine Babo". Após disputa judicial, os irmãos foram reconhecidos como co-autores. O livro traz os dois selos da gravadora, incluindo o "Adaptação de Lamartine Babo da marcha "Mulata", dos irmãos Valença".

Bê-á-bá
Há, claro, o bê-á-bá, remontando à fusão que bandas militares do início do século 20 fizeram de marchas, maxixes, dobrados e polcas, criando uma nova música, que ainda não está claro se veio a reboque da dança ou o contrário.
Bem depois viria o reconhecimento para além de Pernambuco, como relata Antonio Maria sobre a noite em que levou Orson Welles a um cabaré no Recife, onde o diretor escutou um frevo. "Welles ouviu com os olhos abertíssimos (sempre fez muito olho, o nosso Welles) e disse que era espantoso. Mas achou que o frevo jamais sairia do Recife. Discordei. O frevo, um dia, sairá pelo mundo. É a única música que levanta o freguês da cadeira. Agora, é preciso encontrar uma maneira de levá-lo ao mundo. Isto é, descobrir um modo de simplificá-lo (mesmo adulterando-o), até torná-lo possível ao gosto e aos nervos do mundo."
O ritmo, mostra o livro, chegou a Hollywood -caricatural, mas chegou. Em "Romance Carioca" ("Nancy Goes to Rio", 1950), Carmem Miranda sai de um pandeiro gigante e, ladeada por bailarinas frevando, canta e dança com um turbante adornado com sombrinhas de frevo. Ironicamente, justo o ponto forte do livro -as imagens- evidencia a depauperação do frevo ao longo dos anos. Os registros de Verger e Gautherot são instantâneos de uma espontaneidade perdida, de uma delicadeza que há muito se foi.
A idéia de cotejar as fotos antigas com outras de Carnavais recentes só escancara o abismo. Por mais que se fale em renovação do ritmo, as imagens de hoje revelam que o frevo do século 21, tal qual este livro que o celebra, depende de produção para exalar um frescor que um dia foi inato. (FÁBIO VICTOR)


FREVO - 100 ANOS DE FOLIA
Organizadores:
Camilo Cassoli, Luiz Augusto Falcão e Rodrigo Aguiar
Lançamento: Timbro
Quanto: R$ 95 (240 págs.)


Texto Anterior: Feras no frevo
Próximo Texto: Depoimentos
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.