Índice geral Ilustrada
Ilustrada
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Crítica Drama

Filme reencontra diretor irredutível a cinema de "bons modos"

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Para David Cronenberg, não existe doença mental -ou antes: toda dor psíquica tem uma tradução física. Basta ver a primeira cena de "Um Método Perigoso" para entender seu pensamento: uma mulher contorce-se dentro da carruagem que a leva até um hospital psiquiátrico.

A doente é Sabina Spielrein e, quando começa seu tratamento com o dr. Jung, tratamento pela fala, nota-se com clareza ainda maior como se manifesta essa doença: na dificuldade de falar, nos retorcimentos agônicos do corpo, na sufocação que parece inscrita em seu olhar.

Sabemos desde então por onde passará, no filme, tanto o encontro como o conflito entre C.G. Jung e Sigmund Freud: pelo corpo. O corpo contido, protestante de Jung. E o corpo inquieto, judaico de Freud -inquietude manifesta no olhar, no charuto.

Haverá no meio outros corpos, mas o essencial é o de Sabina, cuja melhora a leva a tornar-se amante de Jung.

Sabina -aliás uma futura psicanalista- é, de início, um corpo em que a dor é produzida pela violência paterna.

A moça transforma-se, com o tratamento, em corpo de amor, de prazer. Um prazer que não exclui a dor -e Cronenberg parece ser o último cineasta a saber filmar cenas de sexo, isto é, de amor.

Sabina será também, ao menos no filme, o eixo do conflito entre Freud e Jung. Ela ama a Jung, mas entende melhor a Freud: é da resistência de Jung à abordagem da sexualidade por Freud que nasce a distância entre os dois homens.

Se os filmes mais recentes de Cronenberg pareciam obra de um cineasta conformado, "Um Método Perigoso" o reencontra na trilha de autor irredutível ao cinema dos "bons modos". Podia-se temer que, ao abordar as relações entre um grupo de intelectuais, ele tivesse cedido ao "filme de arte".

Seu "Método" prova que não, que é um cineasta do "filme de filme". E o que é próprio do humano, visto por Cronenberg, é o sofrimento, a agonia, o gozo: o perigo, enfim, de que essas aventuras intelectuais, a da psicanálise e a do filme, constituem uma demonstração.

Por fim: se Cronenberg não esconde que sua simpatia científica pende para o lado de Freud (o que já é bem mais que nada, neste momento em que se acredita na cura não pela fala, mas por pílulas mágicas), não deixa de reconhecer o que há de poético no pensamento de Jung.

UM MÉTODO PERIGOSO

DIREÇÃO David Cronenberg
PRODUÇÃO Canadá/Reino Unido/Alemanha/Suíça, 2011
ONDE Cine Sabesp e circuito
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
AVALIAÇÃO ótimo

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.