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Crítica Documentário

Longa que perfila cabaré parisiense vai além da dissertação fria sobre o striptease

ALCINO LEITE NETO
ARTICULISTA DA FOLHA

Se tudo neste mundo acaba por ganhar status de arte, da gastronomia à moda, do grafite ao videogame, por que não considerar o striptease uma empreitada artística -e das mais sedutoras?

É o que pensam os produtores do Crazy Horse, cabaré parisiense inaugurado no ano de 1951. Seu objetivo: oferecer a nudez feminina ao público na forma de um espetáculo "de qualité".

Mas o striptease de palco é também uma arte vintage, como a ópera, a pintura e o cancã -fadado ao anacronismo, ainda mais após a onda de exibicionismo que se disseminou pela internet.

Para evitar que o Crazy Horse não ficasse entregue às moscas, a casa francesa resolveu se atualizar.

Em 2008, convidou o afamado diretor e coreógrafo Philippe Decouflé -que já trabalhara no Cirque du Soleil e na criação de videoclipes- para inventar um espetáculo que renovasse a estética do striptease.

É a criação desse espetáculo, chamado "Désirs" (desejos), que o grande documentarista norte-americano Frederick Wiseman, 81, registrou em "Crazy Horse", que será exibido no festival É Tudo Verdade hoje e amanhã.

O filme é obrigatório para os admiradores do cinema, do documentarismo e também da beleza feminina.

Comecemos por elas. As garotas do Crazy Horse são criaturas adoráveis, deusas acrobatas, frágeis e vigorosas, que não receiam exibir suas vergonhas estetizadas nos palcos e também, nos bastidores, as mesmas vergonhas "au naturel" para a câmera de Wiseman.

Como documentário, é um filme que tem lições a dar. Wiseman sabe que o Crazy Horse é um templo de Eros mas também um local de trabalho. Sem recorrer ao estilo dissertativo de boa parte dos documentaristas, ele mostra todas as etapas da "linha de produção" das fantasias sensuais do cabaré -do peruqueiro ao iluminador.

A novidade dos números de striptease criados por Decouflé se baseia nos truques de iluminação.

O coreógrafo transforma o Crazy Horse num teatro de luzes e sombras, numa "câmera escura", onde os corpos nus funcionam como uma espécie de tela sinuosa, na qual são projetadas formas coloridas da dança.

"Não sou senão uma sombra e vós, a claridade", diz Cyrano de Bergerac a Roxane -diálogo citado no filme.

Wiseman toma essa frase como mote para criar, além de uma fascinante descrição do Crazy Horse, um documentário sobre os jogos de atração e repulsão entre o cinema e o teatro, entre a luz e os corpos, entre os desejos e as sombras.

CRAZY HORSE

DIREÇÃO Frederick Wiseman
PRODUÇÃO França/Inglaterra, 2010
QUANDO hoje, às 15h, no CCBB-SP, e sáb., às 19h, no Cinesesc
QUANTO grátis
CLASSIFICAÇÃO 16 anos
AVALIAÇÃO ótimo

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