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São Paulo, domingo, 19 de janeiro de 2003

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ANDAR DE BAIXO

Distritos da periferia vivem "inchaço' populacional, mas mercado produz ainda poucos imóveis de até R$ 40 mil

Lançamentos desviam dos entornos

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Ao longe, tudo parece igual. Prédios e casas no mesmo estilo, com o mesmo tamanho, a mesma fachada. Essa é a impressão que se tem ao chegar a áreas onde a presença das classes C e D é mais forte, como Lajeado e Cidade Tiradentes, na zona leste de São Paulo.
O visual, padronizado e sem luxos, remete à história desses bairros e de seus moradores. Muitos surgiram a partir de conjuntos da Cohab ou de outras obras promovidas por órgãos públicos para minimizar o déficit habitacional.
Os imóveis são simples. A área útil das casas da CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano) varia de 39 m2 a 45 m2. As unidades do Cingapura, produzidas nas gestões de Paulo Maluf (PPB, 1993-96) e Celso Pitta (PTN, 1997-2000), possuem 43 m2. Os conjuntos habitacionais da atual prefeitura têm 27 m2.
Dentro de cada unidade, famílias com renda de até seis salários mínimos mensais e que, muitas vezes, moravam em áreas de risco antes de receber a sua casa.
Pessoas como Jussara da Silva, 33, que vivia com os cinco filhos em um barraco prestes a cair e que hoje paga cerca de R$ 40 por mês para ter uma casa própria em um condomínio da CDHU em Lajeado. "Só o prazer de ter uma casa limpa, boa, onde meus filhos não corram risco, é um direito que ninguém pode me tirar."

Exclusão
Mas ainda faltam muitos direitos a conquistar. Lajeado é um dos últimos distritos no ranking do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) calculado pela Secretaria do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade de São Paulo, com o mesmo método que a ONU (Organização das Nações Unidas) utiliza para medir o desenvolvimento dos países.
Dentro de uma escala que vai de zero a um, o índice em Lajeado é de 0,38. Isso significa que o distrito apresenta condições de vida equiparáveis às de países africanos. Na ordem, os últimos do ranking do IDH são os distritos de São Rafael, Parelheiros e Marsilac.
O Jardim Ângela, na zona sul, que no levantamento da Urban Systems Brasil possui a maior concentração de classe D, está apenas duas posições acima de Lajeado, com um índice de 0,4. Em razão da correnteza que leva a pobreza para a periferia, a população do Jardim Ângela cresceu 71,3% em nove anos. Lá vivem hoje cerca 243 mil pessoas.

Investimentos
Paradoxalmente, essa explosão não parece ter sido acompanhada pelo interesse da iniciativa privada. Mais atento à demanda das classes A e B, o mercado imobiliário não tem dedicado muitos investimentos à moradia popular.
Segundo dados da Embraesp (Empresa Brasileira de Estudos do Patrimônio), dos 2.903 lançamentos na cidade nos últimos oito anos, só 53 ofereciam unidades orçadas em até R$ 40 mil.
"Nós vemos hoje uma contração do mercado imobiliário formal para a classe média, a classe média baixa e a baixa", afirma o urbanista Kazuo Nakano.
Algumas construtoras, porém, vêem no nicho popular uma aposta promissora. "Constatamos que o volume de imóveis populares aqui é insuficiente diante da demanda", diz Gustavo Gusmão, diretor regional da empresa mineira Tenda, que está no mercado paulistano há quatro anos.
Desde então, a Tenda já fez 14 lançamentos -nove foram completamente vendidos. São 1.372 apartamentos, por R$ 35 mil em média cada um. Para facilitar as vendas, a empresa não exige comprovante de renda nem fiador.
A MRV, também mineira, seguiu rumo diferente. Seus imóveis custam de R$ 35 mil a R$ 67 mil e têm cerca de 52 m2, mas são em bairros como Morumbi e Jabaquara. "Vimos que as pessoas queriam morar em um ponto melhor", diz Eduardo Barreto, diretor de vendas da MRV, que lançou sete residenciais. Das 750 unidades, 690 foram vendidas.
(AMARÍLIS LAGE)


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