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Fala, presidente
Meu nome é Getúlio
Para retomar o poder, Vargas ataca os privilégios e as oligarquias e promete fazer do país o "orgulho das Américas"
Por Isabel Lustosa
Trabalhadores
do Brasil,
Mais uma vez me
apresento diante de
vós para pedir-vos o
voto, a mais valiosa prova de
confiança que o povo pode dar
a um homem público.
Mais uma vez enfrento adversários renhidos, intransigentes, sem nenhuma virtude
cívica ou sentimento de amor
pelo Brasil, ciosos de seus privilégios, agarrados a eles.
Quem diria que nossa pátria
chegaria ao terceiro milênio
dominada pelas mesmas velhas
oligarquias que agora se aliam
ao capital financeiro para tirar
o sangue do povo? Quem diria
que chegaríamos ao século 21
sem as nossas empresas estatais, cuja edificação foi levada a
cabo à custa de tanto sacrifício?
Empresas lucrativas que foram vendidas na bacia das almas a estrangeiros e seus testas-de-ferro, tirando das mãos
dos brasileiros a produção do
aço para a indústria, e o controle sobre as riquezas do subsolo,
em um projeto de lesa-pátria
que incluía também a venda da
Petrobras. Coisas pelas quais
tanto lutei.
Quem diria que veríamos novamente as manchetes dos jornais ocupadas com escândalos
sensacionalistas que em nada
engrandecem ou dignificam a
imprensa brasileira? Aumentados em suas dimensões por
parte dos envolvidos para fazer
esquecer os reais problemas do
povo. Sim, brasileiros, a quem
aproveita essa seqüência de escândalos? Quem se beneficia
com a retirada do foco dos problemas que realmente vos afligem?
Eu vos respondo: os mesmos
de sempre, os eternos inimigos
do povo humilde: os que se locupletam com o lucro exorbitante dos bancos; os que controlam os grandes monopólios
de comunicação; os coronéis
do latifúndio improdutivo e o
grande capital financeiro internacional.
Preso ao destino
São eles que não desejam a
valorização do homem assalariado nem as leis trabalhistas,
menos ainda a legislação sobre
os lucros extraordinários.
São eles que subvencionam
brasileiros inescrupulosos; que
seduzem os ingênuos e que
-em nome de um falso idealismo e de uma falsa moralidade,
dizendo atacar sórdido ambiente corrupto que eles mesmos, de longa data, vêm criando- procuram evitar a libertação nacional.
São eles que querem manter-vos na obscuridade, no atraso,
sem escola e sem saúde, pedintes, massa de manobra para
seus projetos antipatrióticos.
Contra eles lutei e continuarei lutando.
Sou candidato por não poder
assistir sem lutar à derrocada
do patrimônio nacional, à desmoralização do funcionário público e ao sucateamento das repartições. Sou candidato porque não posso assistir ao abandono a que foi relegado o homem do campo, sem nenhuma
assistência contra a miséria das
secas e das enchentes que milenarmente o vêm obrigando a
abandonar seu lar e sua terra;
sou candidato porque não posso suportar a visão de milhões
de jovens brasileiros fora da escola e sujeitos aos apelos fáceis
do crime; sou candidato porque
tenho que me manifestar em
defesa das conquistas dos trabalhadores que vêm sendo gradativamente sabotadas.
Venho como um homem
cansado da luta, derrotado mas
nunca vencido, pois foi por vós
que sobrevivi às odiosas campanhas que contra mim moveram os vossos inimigos.
Não me arrependo e não me
queixo do abandono em que me
deixaram depois de tantos anos
no serviço da pátria. Depois de
tantos anos no poder eu me vi
inteiramente só e desacreditado. Meus inimigos queriam
mais, queriam arrastar a mim e
a minha família na lama.
A derrota só não lhes bastava,
era necessária a humilhação do
presidente e, com ela, a de seu
povo. Aceitei o sacrifício com
resignação pois sei que a pátria
nada nos deve, nós é que a ela
tudo devemos: trabalho, dedicação e amor.
A grande pátria
Eu vos conclamo a me auxiliar nessa luta pela reconquista
de todas as ações pelo desenvolvimento do Brasil e dos brasileiros que empreendi nos tantos anos em que mereci a confiança e o amor de vocês.
Um homem não pode fugir
ao seu destino e o meu está definitivamente associado ao vosso. Quero vos servir, quero fazer do Brasil, convosco, a grande pátria de um grande povo,
orgulho das Américas.
Estou pronto: levai-me convosco.
Meu nome é Getúlio Vargas.
ISABEL LUSTOSA é cientista política e historiadora da Casa de Rui Barbosa (RJ).
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