São Paulo, domingo, 08 de outubro de 2000

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Arte multicultural em Estocolmo

Estocolmo oferece pontos altos incontestes, como a imperdível Statidsbibliotek do arquiteto Asplund, sendo reverenciados ainda o programa de Maria Lind para o Moderna Museet e o Fargabriken, lugar alternativo para exposições. Mas é no porto que o visitante tem de se render ao requinte da contemporaneidade, diante do fabuloso armazém chamado Magasin 3. Em pouco mais de dez anos de atividades, alguns dos mais contundentes artistas passaram por ali: Christian Boltanski, Penck, Richard Long, Felix Gonzales-Torres, Agnes Martin, Baselitz, Bruce Nauman, Gilbert & George e Walter de Maria. A abrangência da lista demonstra a possibilidade de implantar uma consistente política cultural sem, contudo, cair em escolhas sectárias. Até junho último, era possível apreciar um trabalho de Ernesto Neto feito especialmente para o local. Na linha de esculturas orgânicas que vêm consagrando o artista brasileiro, um gigantesco "colchão" amebóide havia sido instalado, unindo as colunas da sala. As pessoas podiam andar ou deitar nessa forma mole que parecia estar devorando o espaço interno da galeria. Acirrando a dualidade entre a abstração e o figurativo, o artista fez uma bela demonstração de suas afinidades com diversos campos de conhecimento, como a astronomia, a biologia e a física. Atualmente, uma retrospectiva com 227 fotografias de Weegee, da coleção Berinson, pode ser vista até o dia 10 de dezembro. Tido como o pioneiro do fotojornalismo, Weegee (1899-1968) é apresentado numa montagem sensível e generosa, avessa às categorias históricas ou temáticas. Documentou como ninguém os bas-fonds de Nova York, uma paixão que o levou a adaptar seu carro, transformando-o em moradia, acoplado a um rádio da polícia para receber as informações em primeira mão. Dono de um luminoso claro-escuro, Weegee fotografou casais de todos os extratos sociais, cuja melancólica decadência foi, num certo sentido, traduzida e atualizada nas imagens de Nam Goldin.

Evitar o pieguismo
Tampouco pode ser desprezada a exibição permanente da instalação "Dawning" (Alvorecer) de James Turrell, o artista famoso por decupar espaços no teto para a visão do céu.
A presença de Turrell em Estocolmo representa uma referência a mais numa cidade que celebra visões multiculturalistas, sabendo evitar o pieguismo correlato, conforme podemos ler na recente edição da revista "nu" ("The Nordic Art Review").
O artigo alerta para um outro neocolonialismo que está se alastrando por grandes exposições coletivas, nos moldes das bienais, proliferando em cidades "exóticas" como Brisbane, Cairo, Dacar, Havana, Istambul, Johannesburgo, Lima, Liubliana, Santa Fé. A segunda Bienal do Mercosul não escapou da recorrente temática do deslocamento e do hibridismo cultural: o evento de Porto Alegre ganhou um destaque de meia-página. (Lisette Lagnado)



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