São Paulo, domingo, 10 de maio de 2009

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CADEIA DE INFORMAÇÃO

16 de abril de 2009
Caro Paul,

É verdade que sou otimista quanto às possibilidades de longo prazo do jornalismo, mas a última coisa que quero é incentivar a "inação".
Você quer ação para preservar um modelo de jornalismo de jornais que nos serviu bem por um século. Eu acho que podemos construir algo melhor.
Você fala das forças de longo prazo que se alinharam contra os jornais. Elas são reais.
Mas você passa por cima de muitas das forças compensatórias -políticas, econômicas e tecnológicas- que beneficiam o jornalismo e também a cultura cívica que o cerca.
Hoje vemos novas e vastas eficiências na distribuição, graças à passagem da mídia impressa à digital. Existem oportunidades inusitadas de participação na criação, curadoria e discussão das notícias.
O acesso às informações governamentais também se tornou mais fácil.
Enquanto isso, novos sites -incluindo um que eu criei, Outside.in- permitem aos cidadãos tratar de questões "hiperlocais" ao nível de quarteirões e bairros das cidades, coisas que os jornais de cidades jamais poderiam alcançar.
Tudo isso vem acompanhado da capacidade de agregar muitas vozes diferentes num único site, sem pagar pelos custos de criação desse conteúdo.
Mas falemos sobre o que está acontecendo agora mesmo em minha terra natal, o Brooklyn.

Fatos escusos
Você fala do declínio da cobertura jornalística do governo estadual em Nova Jersey. Nos últimos três anos, a questão cívica dominante no Brooklyn tem sido a polêmica em torno de um grande projeto de reurbanização, o Atlantic Yards.
No Outside.in, a página dedicada ao Atlantic Yards reúne notícias, reportagens, comentários e bate-papo. Nos últimos cinco dias saíram 30 artigos.
A edição impressa do "New York Times" publicou só uma matéria, nos últimos 30 dias, mencionando o assunto.
Quão mais rica será a cobertura de uma questão pública importante como essa nos próximos cinco anos?
Grandes bloggers irão apresentar notícias pela primeira vez, comentar acontecimentos e até ganhar dinheiro.
Pessoas e sites com paixão por trazer fatos escusos à tona -como o corajoso blog Atlantic Yards Report- irão comparecer a todas as audiências públicas para formular perguntas difíceis e vão postar na internet transcrições das audiências, com comentários adicionais.
Amadores locais irão vasculhar documentos públicos em busca de detalhes reveladores, e pais presentes às audiências escreverão em blogs sobre o impacto em escolas específicas à sombra do projeto.
E sites irão financiar artigos investigativos sobre o histórico passado das empresas envolvidas na construção.
Se forem espertos, jornais como o "New York Times" e o "New York Post" vão aproveitar essa cobertura, compartilhá-la com seus leitores, usá-la para vender anúncios locais e às vezes colocar um de seus repórteres treinados para desenvolver artigos novos.
Estes últimos, por sua vez, acrescentarão valor enorme à cadeia de informação, e o ciclo inteiro recomeçará.

Menos jornalistas
Sim, é verdade que no final desse processo haverá menos jornalistas oficiais de jornais cobrindo acontecimentos como o Atlantic Yards. Mas haverá um declínio correspondente no engajamento cívico público? Não acredito.
Você fala sobre o velho sistema dos jornais aumentar o engajamento em parte porque as pessoas tropeçavam na primeira página a caminho das páginas de quadrinhos. Eu nem sequer aceito essa premissa.
Qual sociedade lhe parece incluir mais participação cívica?
Uma em que o noticiário é controlado por uma pequena minoria e onde as interações cívicas das pessoas acontecem como leitura feita a caminho da seção de esportes?
Ou uma em que milhares de pessoas comuns participam ativamente na criação do próprio noticiário?
Steven


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